terça-feira, 30 de junho de 2015

banco de jardim...

Banco de jardim…

Tem um fascínio enigmático
Aquele banco corrido,
Em ripas de madeira.

À beira do caminho sinuoso,
Debaixo das ramagens,
Onde me sentei a namorar.
Naquele jardim delicioso
Ao raiar da minha aurora.

Onde ouvi a voz da sereias,
Vibrando as cordas do amor.

Cascatas refulgindo,
Ao sabor doce
Das serenatas.

Aquele banco vermelho
Frente ao lago verde,
Onde vadiavam cisnes,
Em bailados de carmim.

Apenas sonhos coloridos
Que a saudade faz brilhar.

Só os lembra quem os viveu…

Berlin, 1 de Julho de 2015
8h10m
Joaquim Luís Mendes Gomes



Voz da saudade...

Voz da saudade…

Quem não ouviu ao longe
A voz da saudade…
Gritando sem ninguém lhe acudir!

Dilacera as distâncias.
Desfaz as trevas e brumas.
Arrasa montanhas.
Ninguém a vence
E ninguém lhe escapa.

Derrete o gelo polar
Desfaz a fumaça.
Cobre de verde os desertos
De areia.

É um céu a abrir-se.
Uma colmeia de favos
Um lago de mel…

Bendita a saudade
Que nos torna felizes…

Berlin, 1 de Julho de 2015
7h46m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Semente do mal...

Sementes do mal…

Nunca semear sementes do mal.

Ervas daninhas crescerão infestando tudo.
Roubando o espaço
Onde o bem deve e quer nascer,
Melhorando a vida no mundo,
Fazê-lo um reino de sol.

A graça da chuva rega igual.
Não escolhe.
Cumpre como quer a Natureza.

Sua riqueza é regar a terra e encher o mar.

O bem é o sorriso presente
Do Criador.
Mais vale amar sofrendo
Que sofrendo a amar.

Dar o bem é bem melhor
Que o pedir
Ou não o ter para dar.

A alegria só vem quando o mal se for
E não mais voltar.

Para colher na hora,
É preciso semear bem
E na terra certa.

Ouvindo Schubert

O sol é rei no céu azul e limpo

Berlin, 1 de Julho de 2015
5h50m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Diabo do bicho...

Décimo quinto poema da varanda na casa nova

Diabo do bicho,
Um saco cheio...

Nem que seja de berlindes.
Ninguém se atira para o caminho,
Sem tomar as precauções.

Fazer a mala.
Ninguém gosta, mas tem de ser.
E há-de faltar sempre alguma coisa.

Os pijamas. Chinelos de quarto.
Escova dos dentes
E aquela trapalhada toda
Da roupa ligeira.

Toalhas de banho.
E fatos do mar.
Óculos de sol
E bronzeador.
A caixa dos discos
Para acompanhar.

Ah! E os computadores,
Os mafarricos.
Últimos gritos
De estarrecer.

As penes da net…
P’ró facebook.

E, na carteira,
Os cartões do banco.

E, se ainda houvesse,
Aquela infernália toda
Para o fiel amigo…
Vai fazer falta o diabo do bicho…
Descanse em paz!

Berlin, 30 de Junho de 2015
19h9m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Largas vidraças...

Largas vidraças

Desta janela, atrás das vidraças,
Alcanço as velas ao vento
Da gente que passa
Que chega e que vai.

Neste mar de procelas,
Há vagas enormes,
Espalhando ameaças sem fim.
Ninguém lhes fez mal.

Seu lado de dentro, oculto,
Ninguém o devassa.

Fico a vê-las da minha janela,
Atrás da vidraça,
Feito gaivota,
Presa e fechada,
Frente ao mar alto e revolto.
Asas paradas não voam,
Mas vêm quem passa…

Berlin, Reichelt, 30 de Junho de 2015
11h14m
Joaquim Luís Mendes Gomes




segunda-feira, 29 de junho de 2015

Ao Mar Egeu!...

Ao Mar Egeu!...


Vamos afundá-la no fundo do Mar Egeu!
Foi Prometeu e Júpiter
Quem ordenou…

Não se brinca com a Mãe da Europa.

Onde Atenas é capital!...

Reino do mal, ficou a Europa.
Com esse aborto
Que é a União Europeia…
Um antro de perfídia…
Uma monstruosidade!

Ninguém imaginava fosse possível…

Mas foi.

Ruiu a Europa.
A Grécia não.
Portugal também.
Um País irmão.

Vamos atirá-los ao mar!...

Piores que os piratas das Caraíbas.

Fiquem lá até ao fim do mundo.

Repousem no fundo.

Não voltem mais!...

Ouvindo Sherazade

Berlin, 30 de Junho de 2015
7h53m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Nada a fazer...

Nada a fazer…

Quando tudo acabou,
Todos os esforços foram feitos,
Se extremaram as posições,
Deixou de haver diálogo.

Tudo esquece.
E há vontade de viver
Até ao fim.
O dia-a-dia, tal e qual ele aparecer.
Com ardor.
Mais vale tomar outro comboio
E partir
Ao Deus dará.

Assistir ao nascer e pôr-do-sol
Noutras paragens.

Ver o fluir dos rios,
Sempre a correr,
Ora mansos,
Ora afoitos.
Só querem chegar o mar.
Quanto mais depressa melhor.

Atrás duma montanha grande,
Há-de haver outra maior.

Baixar os braços,
Nada fazer
É o pior que pode ser.

Só vence quem for à luta
Enquanto há forças
No corpo e na alma.
Temos tempo…de morrer.

Ouvindo Chopin por Horowitz
Berlin, 30 de Junho de 2015
6h4m

O sol já sorriu e se escondeu

Joaquim Luís Mendes Gomes

rescaldo da festa

Décimo terceiro poema na varanda da casa nova

Rescaldo da festa.
Horas felizes de alegria
No seio da família.


Aquele alfobre onde o amor
Mora puro
Quase divino.

Avós e netos.
Seus pais são filhos.

A célula vital
Duma sociedade sã.
Se ela faltar,
Morrerá o mundo…

Berlin, 29 de Junho de 2015
23h24m

Joaquim luís Mendes Gomes

Antecipar...

Antecipar...

Quando não pode estar toda a gente no dia da festa,
o remédio é antecipar.

Nunca deixar para depois.

É o caso de hoje.

Nascemos os dois
na primeira quinzena de Julho
e, então, estaremos em Espanha,
à beira do mar.

Só uma semaninha,
vai saber a manjar.

Dentro do mar,
de manhã e à tarde.
Vai ser uma festa.

Por isso, esta noite,
haverá farra valente,
com bolo e champanhe.
Uma churrascada a valer,
ali na varanda.

Parabéns a você!
nesta data querida...

Aproveitar tem de ser
enquanto houver.

Berlin, 29 de Junho de 2015
Joaquim Luís Mendes Gomes

domingo, 28 de junho de 2015

nevoeiro...

Por entre a bruma do nevoeiro…
Tomei meu camião.
Comecei a viagem.
Para o lado de lá.
Chovem-me as luzes,
Filtradas de cor,
Banho sem fim,
Em estertor de tarde,
Alvor da manhã.
Praças desertas,
Campos de feira.
Danças macabras.
Jogos da bola.
Folia de graça.
Ventos do norte.
Mundo distante.
Alvoroço constante.
Desejos de paz.
Regaço de mães.
Abraços e beijos.
Sonhos de amor.
Saudade das sombras.
Para sempre lá atrás…
Ouvindo Hélène Grimaud em Adágio de Mozart
Berlin, 29 de Junho de 2015
7h21m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Sapos e rãs...

Os sapos…e as rãs

Infestaram os jornais e telejornais.
Os governos e tribunais.
Belém do sul
E os maiorais viscosos
Que tudo dominam.
Desde o sul ao norte.

É só pardais!...
Grasnam. Coaxam…de dia e de noite.
Parecem enxames
De vespas ruminantes e venenosas.

São vampiros.
Gostam de sangue.
São ladrões das vidas,
Como chacais.

Cegos e moucos.
Devoram os fracos
Temem os ricos.

São invertidos.
Rastejam de gatas,
Temem a troika, voraz,
Espumam da boca.

Que “puta” de tropa
Nos tomou de assalto!...
Cavalos de tróia!
Barris de peçonha!

Uns sem vergonha.

Desconhecem a honra.

Muito piores

Sapos e rãs!…

Berlin, 29 de Junho de 2015
5h33m

Ameaçando chover

Joaquim Luís Mendes Gomes

Varanda dos espíritos...

Varanda dos espíritos…

Pela madrugada alta,
Se entretêm bailando,
À luz do luar.

Desafiando incautos,
Com suas baladas.
Seduzem de encanto.
Querem levá-las.

Há sempre quem caia.
Ficam vogando,
Almas penadas.

Se entranham nas mentes,
Carentes…
Tão esfomeadas.
Semeiam o mal.
Enganam o mundo.
Miragens de verde,
No deserto da vida.
Há sempre quem vá,
Cantiga de fadas.
Fácil riqueza.
Não presta para nada.

Ouvindo Frei Hermano da Câmara

Berlin, 28 de Junho de 2015
22h42m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Reparar os erros...

Décimo terceiro poema na varanda da casa nova

Reparar os erros…

Nunca te arrependas ao cair do dia,
Sobretudo, se lesaste alguém,
Mesmo sem querer
E pedires desculpa.

É a regra básica da convivência sã.
É uma onda que vai e vem.

Lava e refresca.
E dispõe bem.

Nada pior que ir para a cama
De barriga cheia,
E a consciência arder.

Por mais voltas e reviravoltas,
A noite é longa,
O sono não vem.

Para se ter bons sonhos,
A regra de oiro
É preciso dar e saber pedir.
Emendar os erros,
Sem guardar rancor.

Ouvindo Borodin, segunda sinfonia

Berlin, 28 de Junho de 2015
21h45m
Joaquim Luís Mendes Gomes





sábado, 27 de junho de 2015

com bandoleiros e arlequins...

Com bandoleiros e arlequins…

Não se fazem festas de paz e de alegria
Com bandos de bandoleiros,
atacando pelas esquinas,

Nem com arlequins às cambalhotas
Pelas praias,
Assembleias,
Debitando pantominas.

Nem com urros e arremessos
Nem com brados
De trapaças,
A toda a hora,
Pelas cidades, vilas ou aldeias,
Espalhando a desordem e a desonra,
Aos vasos cheios de lama preta.

Deitando por terra
Os pilares da casa alegre
Onde reinava a paz e a festa brava
Do amor e da amizade.

Pintando o chão e as paredes,
De arabescos soeses e matizes disfarçados,
Propalando a confusão
E os negrumes,
Como regras de vida amorfa e sem sentido.

Se apagam todas as chamas
Que ardiam com fogo santo,
Como mandou a Natureza.

Se lançaram por terra
As bandeiras rubras, verdes,
Raiadas de sol,
Nimbadas de arcos triunfais
Que a história escreveu a letras de oiro…

Bombardas estúpidas
Só dispararam males,
Por nossos vales verdes,
Cheios de esperança.

Está na hora certa de dizer: - Basta!...

Ouvindo “Sagração da Primavera” de Strawinsky

Manhã de bruma

Berlin, 28 de Junho de 2015
5h11m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Varanda dos silêncios...

Varanda dos silêncios…

Vim para a varanda saborear as ondas de silêncio
que se vão desdobrando
diante de mim.

Chegam de todas as vertentes,
em sulcos rasgados num céu de cinza.

Fazem-me vibrar sensações arrítmicas
que eu não entendo.

Percorrem meu ser
de alto a baixo,
branqueando sombras,
avivando cores
deste quadro de luz
que venho pintando.

Sobem do mais fundo da minha alma
em vagas sucessivas,
as minhas lembranças mais recônditas,
desde as horas distantes
da minha infância.

Umas são doces quase de mel.
Outras são travos.
De tão amargos
sabem a fel.

Duraram tão pouco.
Esplendor de aurora.
Cheia de sol.
Tinha os meus pais.
Um mar de amor.
Depressa secou…

Berlin, 27 de Junho de 2015
23h27m
Joaquim Luís Mendes Gomes






sexta-feira, 26 de junho de 2015

Gestorben...meu mozzi

Décimo primeiro poema da minha varanda na casa nova


Gestorben!...

Nasceu no dia seguinte.
Estava a chover.
Quase gelado.
O entardecer.

Germinou de noite,
na minha cabeça.
Vou-o estender,
pô-lo ao sol.

Se vai colorir,
raios de sol.

Manhã de sorrisos.
Uma aurora a nascer.

Desta vez fui sózinho.
Sem a trela do cão.

Pelo mesmo caminho.
Os mesmos recantos.
Tudo cheirando,
com olhos de ver.

Até a padeira alemã
sentiu sua falta.

- gestorben!...

- Ah! coitadinho...
- já o gostava de ver!

Berlin, 27 de Junho de 2015
8h29m
Joaquim Luís Mendes Gomes



De novo felizes...

Seremos de novo felizes...

Basta o nosso querer.

Ir no encalço dos valores perdidos,
deixados pelos nossos maiores.

Amor ao chão verde
que nos viu nascer.

Suas gentes.

Aqui nasceram e sonharam
por um mundo melhor.
Aqui jazem à nossa beira.
Os saudamos constantemente.

Deles viemos. O nosso sangue
é igual ao deles.

Amor à Família.
Aquele castelo de amor,
erguido em nosso redor.
De pais e irmãos
e seus irmãos e filhos.

Se for sã,
A célula mãe duma sociedade sã.

Ligação ao Supremo.
Não importa o nome.
Deus ou Alá...

Nosso princípio
e razão de ser...
O nosso Pai.
Somos seus filhos.

São só estas
as três nascentes
donde vem a água
e o bem
que nos fará felizes...

ouvindo Mendelsson

Manhã envergonhada

Berlin, 27 de Junho de 2015
6h31m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Remexer...

Remexer...

Impõe-se revolver a terra, limpá-la das pedras e ervas daninhas,
restos de raízes
e deixá-las em ondas e regos,
para a expor ao sol,
para matar os vermes
e carregá-la de energia.

Depois alisá-la e semeá-la de boa semente,
guardada religiosamente no celeiro.

Aspergir-lhe água na conta certa, sem empoçar
e deixar o resto nas mãos da Natureza...

E , de novo, brotará da Terra, a vida verde, em pujança e força...
crescerá arbórea,
com flor e fruto.

Um jardim, um prado,
um mar de pão...

Berlin, 26 de Junho de 2015
5h41m

está cinzento...ameaçando chuva

ouvindo Chopin com Lang Lang ao piano

Joaquim Luís Mendes Gomes

Bola de sabão...

A BOLA DE SABÃO…


Para quê, subir… subir…
Até ver a Terra,
Como uma bola de sabão,
Sem nada em cima,
Parada e só,
Matizada de azul e pérola?

Para quê tanta ciência,
Religiões e teorias,
Revoluções e convulsões,
Navios, TGVs e aviões
Que dão a volta à Terra,
Numa hora?

Para quê,
 Tanta inveja e ambição
De riqueza e de poder,
Sobre tudo e contra todos,
À custa do que for…

Se,

De repente e sem saber,
Rebenta a bola de sabão
Com navios, TGVs e aviões
E todos os que lá vão,
Mais as teorias,

E, quem soprou a bola
Não lhe deita a mão…?


Perpignan, 23 de Abril de 2001- 22h e 46m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Décimo poema breve...

Décimo poema na minha varanda nova

Tentei refrescar minha cabeça no fresco da minha varanda.

Neste dia escuro.
Onde um cometa se precipitou do céu,
Deixando um rasto branco, imperecível.

Larguei os meus suspiros
Nas ondas do vento
Que soprava.

Fui ferido nas minhas asas.
Os meus sonhos ficaram,
Por horas nublados.
Repugna o fim da vida
Que se ama.
Seja uma flor
Ou uma criatura meiga
Que nos estima.

Choveram pedras em catadupa.
Cobriu-se o chão de lama
Com minhas lágrimas.

Fui pequeno demais para tanta dor.
Meu peito jaz cansado
Te tanto bater.
Só espero a paz do leito
E o sono leve da madrugada…

Berlin, 25 de Junho de 2015
21h00m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Cacilheiros do Tejo

Cacilheiros do Tejo


1

Quem não conhece
Os mansos cacilheiros.

Deitam-se com a lua..
E
São os primeiros
A acordar Lisboa.

2

Quando se deita tarde
 a Madragoa,
Levam as varinas,
Trazem os marinheiros.

Amarram a Cacilhas
E ficam a’dorar Lisboa…

3

Grasnam as gaivotas,
Dormem os peixinhos,
Gemem as canoas
Bailam os cacilheiros
A embalar Lisboa…

4

Se o Tejo cansado dorme,
E a lua cheia espelha,
Sonham os cacilheiros
Co’as namoradas;
Choram as canoas.


5


Pela madrugada morna,
Se a brisa morna aquece,
Bailam os cacilheiros;
Gemem as canoas,
Nas ondas qu’ o Tejo tece…



6

Se o mar bravio, ao longe,
O Tejo negro enfurece,
Oram as namoradas,
Rezam as canoas.

Só aos cacilheiros
O Tejo encrespado
 obedece.


7


E se o nevoeiro cai,
E lhes rouba o Tejo,
Choram os cacilheiros
Por não verem, tristes,
 Onde está Lisboa…


8


Voltam os marinheiros,
 Querem as varinas.
Canta a Madragoa...
Dançam as gaivotas.

E os ledos cacilheiros,
Largam tristes suas canoas.


9


Quando Lisboa acorda,
E o Tejo manso abraça,
Pede ao Cristo-Rei
Que lhe dê Cacilhas,
Lhe traga Almada.


10


Voam as gaivotas,
Chegam caravelas
 Mai’los seus cargueiros.
O Tejo baloiça e corre.
Dançam as canoas
 Bailam, ao lado, ternos,
 Os cacilheiros bailam…



11

E, assim,
Sonham os cacilheiros, mansos,
E baila e bailam,
até ao fim do mundo…


Almada, 30 de Novembro 1999

Joaquim Luís  Mendes Gomes

vade retro, sahtahana!...

Arrojo ao mar esta mágoa crua…

Lancinante, quase uma falta humana,
Esta perda amarga
Eu arremesso ao mar.

Fique vogando. Por esse infinito fora.
Quase uma estrela
Se apagou agora.
Escureceu o dia.
Desaguou a noite.
Ó ave agoirenta
Me levou o Mozzi!...

Vade retro, sahtanah!...

Berlin, 25 de Junho de 2015
11h16m
Joaquim Luís Mendes Gomes



ao meu canito loiro...

meu canito loiro...

choro-te meu adorado canito loiro
meu e nosso fiel amigo,
de há meia vida, mais velho que todos meus netos...

foste acarinhado. foste um senhor.
e correspondeste,
a cem por um...
sempre dócil...
nunca falhaste.

descansa em paz.
se houvesse céu para os cães...tu o merecias ganhar...

ao Mozzi...

Berlin, 25 de Junho de 2015
8h40m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Em surdina...

Em surdina...

Com brandura e pézinhos de lã,
vamos abandonar o barco,
deixêmo-lo seguir,
tomemos nosso destino,
à nossa conta.

Vamos para um lugar distante,
onde não cheguem estes ventos
de desvario louco
e comecemos tudo de novo.

Enterremos bem fundo,
sob as profundezas mais profundas,
estas horas e anos
de desatino,
que avassalaram nossas vidas,
fazendo crer
que assim deveria ser
até ao fim.

Nunca mais poderíamos sonhar,
como quando éramos meninos,
tudo era belo e lindo
e o céu azul,
cheio de sol.

Durou tão pouco tempo.
Depois da escola,
veio a guerra,
foi-se a paz,
apagou a chama da esperança.
Veio a derrota.
O abandono ao desbarato.

Por fim, fomos invadidos
por esta horda de irresponsáveis...
Tudo destruiram.

E até a nós, se não fugíssemos...

Berlin, 25 de Junho de 2015
7h39m
à hora em que o nosso cãozito Mozzi, um companheirão de há dezasseis anos, está agonizando em paz ao pé de quem ele amou...e nós a ele...

Joaquim Luís Mendes Gomes

Do fim para o começo...

Décimo poema na varanda da casa nova

Do fim para o começo

Só virando tudo do avesso,
se alcança a verdadeira forma e conteúdo
de tudo que nos circunda.

Nada é aquilo que aparece
à primeira vista.

Primeiro, são só cerimónias,
tudo aberto.

- Entre. A casa é sua!

Não é preciso muito.

De todo o lado,
surgem desculpas.

- A gente queria...mas não podemos...

Não adianta os laços e o parentesco.

De irmão ou primo.
De tio,
De sogro ou sogra.

Muito menos vizinho.


Só o amor a sério,
como o dos pais,

nem sequer o inverso...

tudo aguenta e nunca se nega.

Berlin, 24 de Junho de 2015
20h36m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Círculo...



     O CÍRCULO…






Antes,
No mundo,
Tudo era vazio.
Tudo era noite.
Tudo era fundo,
Tudo era recto,
Só o nada era
E… o silêncio.

Ninguém sabia
Certo,
Onde era o fim,
Onde era o começo.

Não se sabe como,
Daquele nada…
Tudo saíu.


Primeiro,
Nasceu um ponto.
Nem era grande
Nem era pequeno.
Era só um ponto.

Olhou p’ra si
E seu redor.
Estava só.

Saíu, em frente,
Até onde
Lhe deu a força,
À procura
D’algo,
Igual a ele.

Ao caminho
Que andou
Chamou de raio.

E preso ao raio,
Pôs-se a andar,
Sem perder de vista

O sítio,
Donde saira.
Andou… andou…




E, ao cabo,
Viu que o sítio
Onde parou
Era o mesmo
Donde partira…

Àquele caminho
Rondo,
Ele chamou…
De círculo.
…. … …

Depois…
Não se sabe
Por quem
E como:
… … …
Da noite
Se fez o dia.
Daquele vazio,
Se fez o alto
E o baixo.
E,
Com alto
E baixo,
Em conto certo,
Se encheu
Um círculo,
Pequeno ou grande?…

Em tudo igual
Ao universo.







Perpignan, 26 de Maio de 2002
11h e 23m
Joaquim Luís Mendes Gomes

ligações perigosas...

Ligações perigosas...

Num abrir e fechar de olhos,
nos vemos embaraçados,
no meio do trânsito.

Passam rentes, de todos os lados.
Ultrapassam.
Sem assinalar.
Vociferam desalmados,
se os travam.

Piores que eles são os motocas.
Como serpentes,
nos assustam,
nos embaraçam.
Parecem ratos.
Roem buracos.
Nada respeitam.

Depois, os polícias.
Uns disfarçados,
Parecem turistas.
Acendem o letreiro.

- Seus documentos
- infringiu a lei.
Aqui vai a multa.
Fica sem carta,
se não pagar a pronto...

Se não tem dinheiro,
há multibanco...

A seguir um lugar
para deixar o carro.
Tudo tapado.
Tanto dinheiro empatado!
'Inda falam em crise!...

Tempo perdido.
Nervos em franja.
Só num parque pago,
Grande negócio.
Bem garantido.
Golpe de artista,
luvas por fora,
muito certeiro.

Tantas laçadas...

Bar motocas, 24 de Junho de 2015
17h30m
Joaquim Luís Mendes Gomes

terça-feira, 23 de junho de 2015

Canto do cisne...

Canto do cisne...

Lânguido e triste
este canto breve,
fumo leve
a subir ao vento,
acorde suave dum agonizante pranto.

Soando a esperança seca
que murchou já morta.


Berlin, 24 de Junho de 2015
5h45m

ouvindo e vendo do " Lago dos cisnes"...

Joaquim Luís Mendes Gomes

Ao frio e à chuva

Nono poema na varanda da nova casa

Ao frio e à chuva

Caía chuva. Fazia frio.
No lusco-fusco.
Voltei para dentro.
Escrevê-lo. Eu vou tentar.

Faz-me falta o real da tarde,
Ressoando ao vivo,
Ao chegar da noite,
Como é diferente,
Ali na varanda.

Cheira-me a vento.
Oiço o silêncio chegando
Em maresia.
Um marulhar de ondas,
Como se fosse o mar.

Voltam os carros,
Vêm cansados,
Os faróis acesos,
Parecem os barcos
Arribando aos lares.

Despertam as casas,
Do sono do dia,
Estiveram fechadas.
As janelas acendem,
Cintilam tê-vês,
Tilintam talheres,
Toalhas lavadas,
Mesas bem-postas,

A canseira das Mães,
Crianças brincando,
Se enchem de vida
Até ao jantar.

É a noite que cai.
Mais um dia que passa.

Berlin, 23 de Junho de 2015
21h3m
Joaquim Luís Mendes Gomes






segunda-feira, 22 de junho de 2015

Devagarinho...

Devagarinho...
Lentamente, devagarinho,
mas cheguem, se espalhem
por toda a parte,
abundantes,
os frutos da igualdade
que nos liga,
de corpo e alma,
seja qual for a cor
da nossa pele
e os hemisférios
desta grande Terra,
onde nasçamos.
É o mesmo o nosso destino.
Batem ao mesmo ritmo
as pancadas do coração.
É rubro o sangue.
Se se golpeia o peito
ou enrubrescem os nossos olhos.
Escorrem no rosto
as mesmas rugas,
fruto da idade
e do sofrimento
que nos perpassa.
O mesmo jeito de sorrir,
quando a alegria escorre,
do mar largo
da nossa alma.
Sentimos todos a mesma saudade
pela ausência de quem mais queremos
quando, de vez, partiu
ou se tarda em chegar.
Não esquecemos nunca
nem o bem nem o mal
que recebemos
na nossa hora de fartura ou de desgraça.
São as mesmas nossas pisadas pelos caminhos,
quer de areia suave,
molhada ou seca,
quer de terra amarga,
cheios de espinho.
As portas das nossas casas
abrem e fecham
para o mesmo lado,
quando toca a campainha
ou batem palmas
se, lá debaixo, chamam
- ó da guarda!
É igual e funda
a alegria do perdão
de quem magoamos,
por maldade ou sem querermos.
Têm o mesmo cumprimento
e a mesma força
os muitos abraços
que nos damos.
De cansados nos deitamos,
quando chega a hora de dormir.
Ficam alegres e radiosos
os nossos olhos
na hora matutina
do nascer do dia,
com chuva ou sol...
Então, porque não nos havemos de abraçar,
companheiros amigos e amantes
é a mesma nossa viagem
e igual nosso destino,
Este mundo é uma passagem!...
ouvindo Hélène Grimaud ao piano, tocando Rachmaninov como só ela sabe
nasceu cinzendo e molhado este dia de Verão
Berlin, 23 de Junho de 2015
6h47m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Tudo tem seu preço...

Oitavo poema na minha varanda nova

Tudo tem seu preço

Até o lixo tem.
Se recicla ou se derrete.

Revertendo ao mar dos bens.
Ninguém mais sabe a sua origem.

Se serve, vale.
É a fome e é a sede
que fazem mover o mundo.
Só o alimento é que varia.
Sua escala é infinita.
Do essencial ao mais secundário.
O que importa,
a qualquer preço,
é que seja bem
ainda que, no fundo,
faça mal...

Tudo se joga na sua compra.
Nem se atende à qualidade.

Por carência
ou por vaidade,
Desde o extremo ao infinito.
Se faz a guerra e a caridade,
tudo em troca
do benefício...

Berlin, 22 de Junho de 205
22h00

Joaquim Luís Mendes Gomes

reencontro de décadas

Duzentos camaradas de camaradas...

Um batalhão desfardado.
sem armas nas mãos,
na praça das armas.

Pequenino universo,
com o feio e  o belo,
numa mistura presente,
tirada ao acaso.

Onde haja dois homens,
são três as diferenças.
o claro e o escuro,
por vezes, de brilhantes,
fazem sangrar.

Mundos ocultos,
carregados de medo,
debaixo dos olhos
que julgavam defuntos
com medo das sombras.

Rodas e círculos,
com portas cerradas,
fingindo de abertas.

Navios sombrios,
encalhados há muito
e naus catrinetas...

a propósito dum grande reencontro, para muitos o último

Mafra, 19 de Abril de 2015
10h45m

Joaquim Luís Mendes Gomes



domingo, 21 de junho de 2015

Doce claridade do entardecer

Sétimo poema na varanda da casa nova

Doce claridade do entardecer

Quando o sol em forja
se vai diluindo ao longe,
de cansado,
advém uma calma tal
e tal serenidade,
que nosso corpo se distende,
só reclama a paz do lar,
para refazer as forças,
repondo a corda do relógio.

Desliza lento o dia
rumo à noite
que o espera enamorada.

Leva as quimeras
do fogo fátuo
que ardia ao amanhecer.

Só deixou o rasto
de algumas nuvens,
mais as sombras
que vão nascendo,
manta de bruma
que se vai estendendo,
cobrindo a terra.

Aves canoras voam dos ninhos,
correm no ar,
esvoaçando ao vento.

nos autocarros saem e entram
rostos cansados,
rumando a casa,
cheios de fome.

Sina fatal,
o fado da vida
de quem pobre nasceu...

Berlin, 21 de Junho de 2015
21h34m
Joaquim Luís Mendes Gomes





Varanda dos ulmeiros

Varanda dos ulmeiros

Vou para a varanda contemplar o fulgor dos astros
e olhar a sebe de ulmeiros,
à beira da estrada
ao pé do rio.

Vou ouvir a passarada assobiando acordes
em falsete agudo
que ninguém entende.

Aqui me posto atento
nada perdendo,
até tremer de frio, enregelado.

Preciso do choque agreste da atmosfera
para retesar minhas cordas lassas
e fazê-las vibrar ao vento.

Ver os clarões da vida a borbotar em jactos.
Registar na mente
os derradeiros factos
que, no dia a dia,
a história escreve.

Sarsa ardente,
vulcão em chama,
derramando lava,
depois de seca,
fertiliza a terra.

Bebo na fonte,
ali à bica,
matando a sede,
num caudal perene,

Pombo correio,
leio os segredos,
nados do fundo,
para os desvendar,
para bem do mundo.


Só colho a esperança
para a levar no bico.

ouvindo Mozart

Berlin, 22 de Junho de 2015
6h49m

um céu de cinza
Joaquim Luís Mendes Gomes