domingo, 31 de dezembro de 2017

Canecos da nora...



Canecos da nora…

Em golfadas de Agosto, milheirais em flor.
O calor apertou.
Amarra-se um boi à vara da nora.
Roda que roda.
O boi espuma da boca
E a nora vomita.
Golfadas sem fim.
Enchem o rego.
Banham os pés das hastes de milho.

Ouve-se o trinco da nora segurando os canecos.
A terra bafeja e suga que suga.
Adormece em deleite.
Lá para Setembro, a espiga está seca e madura.
Vem a colheita na festa dos campos.
Se enchem de milho os celeiros famintos.

Derramam-se as rasas no ladrilho da eira.
E, na hora certeira, se guardam nas arcas esperando a mó do moinho…

Berlim, 31 de Dezembro de 2017
10h11m
Jlmg

Terra dos cucos...

sábado, 30 de dezembro de 2017

Último dia...



Último dia…

Começa a clarear o derradeiro dia deste ano.
Ininterrupto caminhar do tempo.
Rio extenso que nasceu nos confins.
Ninguém sabe onde vai dar.

Ora calmo e luminoso.
Ora bravo. Tumultuoso.
Como foi o que acaba.

Oxalá chegue a uma planura.
Naquele que amanhã começa.
Cheio de paz e de abundância.
Que a esperança renasça e dê muito fruto.
Renove o gosto pela vida.
Com justiça, em toda a parte.

Ilumine os governantes. Sintam que o poder que têm nas mãos deve ser exercido para bem de todos.

Que o fosso abismal entre países ricos e países pobres se arrase numa planície, de riqueza e de abundância.
A felicidade é um direito universal…

Ouvindo Rachmaninov, concerto nº 2 – por Hélène Grimaud

Berlim, 31 de Dezembro de 2017
7h32m
Jlmg

Poder das palavras...



Poder das palavras…

Não há palavras ocas, roufenhas.
Dispostas em série. Bem arrumadas expressam a alma em ideias sonoras.

Trocadas, valem romances, poemas com história.
Forja de brasas. Rubras. Escaldantes.
Derretem o ferro e fazem o aço.
Vibram os golpes certeiros que matam.
Aliviam as dores e secam as lágrimas que choram.

Terraço ou eira. Secam o grão.
Coram a roupa ao sol da verdade.
Balançam de gozo. Tecem tapetes.
Cobrem espaços vazios.
Fabricam sementes. Grãos de mostarda.
Cobrem de sombra cruzamentos e esquinas.
Amordaçam arrogantes, roídos de traça.
Rapinam segredos dos escombros da morte.
Cobrem as mesas com toalhas de sonho.

Berlim, 30 de Dezembro de 2017
19h20m
Jlmg


Pedra ou pau...



Pedra ou pau…

Pedra ou pau.
Plástico, nunca.
Frio ou quente.
Gelado ou escaldante.
Morno é que não.

Subindo com esforço.
É ganho.
Descendo caindo.
Desastre.      

Chorando, sorrindo.
Humano, de gente.
Rindo, sem alma.
É raiva. Ou escárnio.

Abraço ao de leve, com luva.
É tempo perdido.
Aperto de mão, quente que ate e que sele, amizade.

Ferrugem na chave é porta fechada.
Não deve.
Um pedaço de pão. Ou tigela de sopa.
Quem negue, não merece viver.

Berlim, 30 de Dezembro de 2017
18h9m
Jlmg



Natal da amizade...

Natal da amizade


Não seja gramínea. Planta rasteira. Raquítica.
Cresça nos montes. Nos vales e encostas da serra.
Fervilhe nas hortas. Jardins, ao pé das açucenas.
Regada de orvalho. Lágrimas quentes das faces fidalgas e pobres.

Fermente nos rios. Sobrenade nos lagos.
Fuja dos pântanos. Da lei dos mais fortes.
Abunde nos lares. Se troque nas feiras.
Sem lucro. Moeda de troca.

Desfaça a indiferença. Do vizinho da porta.
Rache o granito e cubra a calçada.
Seja tapete onde passe o mendigo.
Abra janelas e portas cerradas pelo egoísmo feroz e voraz.

Seja o espelho e o sino de todas as horas, lugares e ausências.
Fermente ao sol e à sombra. Mate a fome e a sede da seca.
Regue as gargantas de vinho e água pura da paz.

Berlim, 30 de Dezembro de 2017
17h29m
Jlmg

Por uma areia...



Por uma areia…
Descarrilou o meu comboio.

De tão soberbo, me convenci de que tudo dependeria de mim.
Quando vi que não era capaz, eu desisti.
Troquei de rumo.
Desprezei quem me chamou.

Ninguém me disse o essencial.
De que eu seria só instrumento.
Nas mãos do Artista.
Bastaria ser dócil e não soberbo.
O meu grande erro.
Sem solução.
Impossível de voltar atrás.
A oportunidade passou de vez.

Agora eu vejo. Mas já é tarde.
Bastava confiar.
Eu disse não, em vez de sim…

Berlim, 30 de Dezembro de 2017
12h34m
Jlmg