domingo, 31 de maio de 2015

Eixos quadrados

Eixos quadrados

Se as rodas forem redondas,
Mesmo que seja quadrado,
De trás e à frente,
O carro roda
E chega lá.

Com o inverso,
Qualquer que seja o gás,
Só arrastado.
Nem para a frente nem para trás.

Se quadradas forem
As nossas dúvidas,
Só as alisando,
Ou as desfazendo,
À luz da vela,
Como cera.

Se a vidraça mais pura
Se toldar de vapor d’água,
Não há olhos por mais apurados,
Que os devassem.
Basta um pano enxuto
Ou a luz do sol,
E a transparência vem
E torna claro o opaco
Ou o invisível.

Se o carburador encharcar as velas,
Pode ser um jaguar!
Só de empurrão e
Muita humildade,
Ele voltará a andar.

As vitórias distam tão longe…
Só com muita luta
E muito suor,
Não serão derrotas…

Ouvindo “Nocturnos” de Chopin
Berlin, 1 de Junho de 2015
8h29m
Joaquim Luís Mendes Gomes




Mente deserta

Mente deserta

Árida e deserta está a minha mente.
Impiedoso bateu-lhe o sol
O dia todo.

Não soprou o vento.
Não houve uma sombra
Minha mente está seca como a areia.

Fecho os olhos.
Me ligo à fonte.
E em torrente jorrou água.
Pura e fresca.
Mato a sede.
Refresco o corpo.
Molho os cabelos
E uma brisa ténue
Me acaricia o rosto.

Me lanço ao caminho.
Despertou o ânimo.
Volto à rua
A fervilhar de vida.

Se apressam os carros.
Querem chegar à hora.
Só o sinal vermelho,
abrindo as passadeiras
Lhes tolhem a correria.

Pelos passeios,
Há passos apressados.
Ainda vão a comer a bucha…
Vão para o autocarro.
Chega sempre à hora.

Ainda tão tenrinhos,
Pela mão dos pais,
De mochilita às costas,
Ainda vão dormindo,
Seguem para a escola.

Há os camiões fechados.
Carregam toda a logística.
Basta um toque eléctrico
Escancaram-se-lhes as portadas.
Baixa o elevador traseiro.
E as mercadorias,
Bem empacotadas,
Lá se vão ufanas,
Levam as iguarias,
Das mais variadas
Para as prateleiras,
Já estavam desertas.

Até os corvos negros,
Alheios ao perigo,
Descem à estrada,
Debicam nos passeios
Tudo que lhes interessa
E já não valia nada.

Sobem aos terraços livres
Onde montaram os ninhos,
Têm seus filhinhos com fome.
Ainda não sabem voar.

Berlin, 1 de Junho de 2015
6h51m

O sol ainda não rasgou a cortina cinzenta


Joaquim Luís Mendes Gomes

Pesca milagrosa

Pesca milagrosa

Vejo chegar à praia,
Pela tardinha,
A proa empinada duma barcaça.
Tem o nome belo
De Senhora da Boa Esperança.

Vem carregada,
Rentinha à água,
Quase a afundar.

Passou a noite e o dia,
Lá ao longe,
Em vão,
Lançando as redes.

E só no fim,
Encontraram a bênção
Que a deixou assim.

Vêm exaustos,
Mas tão contentes,
Seus pescadores.
Camisa às riscas,
Grandes barretes.

Uma promessa a cumprir:

Cobrir de flores,
A semana inteira
O altar da ermida
E cantar hossanas
À Padroeira!...

Berlin, 31 de Maio de 2015
23h13m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Ao meu filho Paulo Alexandre

Ao meu filho Paulo Alexandre
(Quando estudava Teologia em Madrid)

Nem o brando luar de Agosto,
Em noite serena de verão...
Nem o orvalho da madrugada
Que refresca
as horas primas da manhã....
Nem a água de fonte santa
Que escorre pura
Da montanha...
Nem as melodias
Do chilreedo
Ao anunciar das primaveras...

Nem os faróis acesos
 da terra extrema
que dão o alerta
aos marinheiros...
Nem o perfume do celeiro
A abarrotar de pão
Para o ano inteiro...

Tem esse brilho,
 quente e fundo
dos teus olhos!...

Essa  frescura
Infinda e doce
Do  mar
do teu sorriso!

Esse encanto,
sábio e puro,
da tua voz!

Essa  luz,
 perene acesa,
do teu olhar!

Essa fartura imensa
do teu amar!...


Madrid, 11 de Novembro de 2000


À beira-morte

Mesmo à beira-morte

É mesmo lá, à beira-morte,
Que ela mora.
A voz lúcida da lucidez.

O céu está limpo e azul.
Não há vento.
Só se ouve a voz
A falar de dentro.

Não há nuvens.
Nem pontos de interrogação.
Só pontos finais.

As vírgulas todas,
De ensarilhadas,
Ficaram caídas,
Nas valetas,
Como folhas secas,
Todas mirradas.

O sol alto,
Muito distante,
Ofusca-nos os olhos,
Penetra-nos a alma,
Jorra de luz.

Não há passado.
Só o instante.
E o futuro está mesmo no fim.

Se olha para trás.
Com olhos de ver.
Como seria diferente tudo
Se voltássemos a nascer!…

Ouvindo o poema “Tabacaria” de Álvaro de Campos por José Viegas

Berlin, 31 de Maio de 2015
18h9m
Joaquim Luís Mendes Gomes





sábado, 30 de maio de 2015

Uma só lição

Uma só lição

Quando chega certa,
na hora justa,
não é preciso um sermão.

Basta uma lição. Breve.
Por alguém de autoridade
e sabedoria,
atenta à nossa realidade.

A sedução ilude.
Chama e apela.
Parecendo uma coisa
e é bem outra.

Tantos caminhos se abrem à nossa frente.

Com o incerto à nossa espera.
Um aviso. Um sinal.
Valem mais que mil reflexões.
Sem todas as bases.

Há o imprevisto e o escolho,
a seguir à curva.
Ninguém gosta de voltar atrás.

Quem se julga saber de tudo
é um candidato sério
ao insucesso e infortúnio.

Humildade de quem quer aprender
é a virtude dos vencedores.
Dos bons artistas.
De quem dá bom fruto.
Serve de exemplo
para quem lá vem...

ouvindo Mendelsson, concerto para violino e orquestra,
com Janine Jansen

o sol sobe tímidamente

Berlin, 31 de Maio de 2015
7h20m

Joaquim Luís Mendes Gomes

Suave e leve

Suave e leve

Suave e leve
como o despontar da madrugada.

Como a brisa branda
que vem das ondas
dum mar em paz.

Como o sorriso terno
ao acolher no colo
um filho querido
dum seu filho.

O chegar a casa
duma ausência breve,
pareceu tão prolongada.

O cair da neve
tingindo de branco
o verde da natureza.

O gorgolejar constante
duma nascente de água
que não pára.

O voar baixinho
da andorinha,
ondulando rente ao chão.

O sono profundo
duma baraçada larga
dum pião.

A tenra mãozita
que aperta a nossa mão.

A tranquilidade eterna
duma consciência
que só fez bem...

Berlin, 30 de Maio de 2015
21h35m
Joaquim Luís Mendes Gomes


sexta-feira, 29 de maio de 2015

Os nossos mistérios

Os nossos mistérios

São tantos…
Cada vez mais.

Porque vim eu, um dia e hora, a este mundo.
Porque sou homem ou mulher.
Porque nasci onde nasci,
Porquê meus Pais
A minha fonte.

E os irmãos e a família
Com que me criei?
E este corpo e esta alma
Que eu sinto?
Esta forma e pendor.

Vejo a luz e vejo as cores.

Porque choro e sorrio,
Com a tristeza e a alegria,
Tua ou minha.

Porque penso e porque falo
Estas palavras,
Em sons e letras
Que espelham meu pensamento,
Este rio com tanta água
Que nasce em mim,
Donde não sei…
Num instante dá a volta ao mundo.
Me liga a mim e eu a ti
E me diz que és tu e eu?

Me faz gostar tanto de alguém
Como de mim eu gosto
Porque sinto amor…
O mistério, de todos,
Sem dúvida o maior…

Ouvindo Kimy Skota com André Rieu

Nasceu cinzento o dia

Berlin, 30 de Maio de 2015
6h36m
Joaquim Luís Mendes Gomes


quinta-feira, 28 de maio de 2015

Halleluya!

Uma chuva de desgraças…

É a saúde.
É o infortúnio.
O geral desvario,
O deserto árido universal
Da cultura dos valores.

O desatino pelas sendas
Da injustiça.
A escravização de quem trabalha
E só quer a paz.
Por minorias desalmadas
E sem escrúpulos
Que nos espezinham.

E, de repente, acontece o impossível.

Pelas mãos paternais do invisível atento e omnipresente.

Uma vaga de esperança e harmonia
Tudo varre
E volta a paz e a harmonia.
Germinam flores e frutos sãos,
Com abundância,
Nos lares de toda a gente…

Halleluya!...

O dia nasceu pardacento

Berlin, 29 de Maio de 2015
6h45m

Joaquim Luís Mendes Gomes

quarta-feira, 27 de maio de 2015

transfiguração dos maestros

Transfiguração dos maestros

Vi-os a emergir dos bastidores,
ainda jovens,
depois mais graves,
frente às orquestras,
nas grandes salas,
cheias, de olhares atentos,

Caminhando com garbo,
um fraque próprio,
em fazenda escura e fina,
corte impecável.

Uns de cabeleira farta,
ainda escura,
baloiçando aos passos,
outros mais comedidos,
de corte soberbo.

Chegarem ao centro.
Do palco elevado.
Uma chuva de palmas.
Para a chave-mestra.

Uma respeitosa vénia
a toda a orquestra mista.

Cheia de cordas
e reluzente instrumentaria,
um piano aberto,
de cauda preta.

Depois, à assembleia
e aos camarotes solenes,
ressumando a festa.

Resolutos, subindo ao tamborete,
Braços em arco,
uma varinha mágica,
olhos nos olhos,
abraçando os artistas.

E, a um clique,
uma nuvem de sons,
em acordes harmónicos,
se eleva e espalha,
enchendo a sala.

Baloiçam os corpos,
como seara ao vento,
surge um diálogo divino,
entre o mestre e a escola.

Retinem tambores,
marcando os passos.
Há toques finos,
e os mais graves,
encadeados
em doce harmonia.

Soam timbales.
Tocam os trombones,
Despertam as flautas.
Parecem zangados.

Ficam suspensos
quando o piano toca.

Mágico bailado,
ondas sonoras,
uma brisa suave,
uma melodia excelsa.
inebriando a sala,
deliciando as almas.

Ó que magia!...
Um mundo novo!...

Galvanizante.
De harmonia e paz...

Uma eternidade
Passou num instante.

ouvindo sinfonia de Mahler

Berlin, 28 de Maio de 2015
7h52m

o dia está fosco

Joaquim Luís Mendes Gomes





meus papeis velhos

Os meus papéis velhos

Os meus papéis velhos
que guardo religiosamente,
são pégadas que deixei pelo meu caminho.

Nem o tempo
nem a chuva
nem o vento as apagou.

De vez em quando
Ponho-me a lê-los ao acaso.
Cada um com sua história.

Há um deles,
em papel almaço,
amarelecido,
dobradinho em quatro.

Me lembro como se fosse ontem.

E de quem mo trouxe.
Pela tarde quente
dum verão há muito.

No primeiro dia das minhas férias grandes.

Da minha companheira
da comunhão solene.
De família rica...
Amor impossível.
Assim eu cria.
Eu era pobre...

Com ela sonhava
no seminário.
A imaginava no seu dia a dia.
A caminho do externato.

Carinha redonda.
cabeleira corrida,
A descer pelos ombros.
Os olhos vivos
mas muito doces.
Que belo sorriso.

Nunca mais falamos.
Só por papelinhos.
Era a Emília quem mos trazia.

Contávamos os dias
que faltavam para as férias.
Como custavam a passar...

Até à hora dum papelinho.

- Como vão os estudos?
Estás a gostar?...
- Quero ser médica...como meu pai.
E tu, sempre queres ser padre?
Esperarei por ti...
A escolha é tua.

Assim dizia aquele papelinho amarelecido,
letrinhas redondas,
já desmaiadas,
em papel almaço...

Berlin, 27 de Maio de 2015
22h47m
Joaquim Luís Mendes Gomes




terça-feira, 26 de maio de 2015

Não quero nunca ser o primeiro

Não quero nunca ser o primeiro em nada

Quero ser quem sou.
Autêntico.
Ciente e sempre à procura
do que tenho e do que posso.
Para ser e para dar.

Só quero ter minha consciência,
banhada no mar da tranquilidade,
mesmo devendo,
porque ninguém tem tudo
e sem a ajuda de Alguém,
tem sempre precisão
de pouco ou muito.

Estar atento. A quem caminha a meu lado,
sentindo o rigor do chão,
ora pedregoso,
ora escarpado.

Pegar na mão para ajudar
e receber ajuda.
Partilhar o bom
e o menos que houver.

Saborear o gosto de viver,
cada instante em plenitude.
Semear a esperança
e a conformação,
sabendo sempre
que, depois duma tristeza,
vem a alegria da bonança.

É na combinação
dos contrastes
dos tons e cores,
que a harmonia cresce,
como seara de verde,
que o calor do sol amadurece.

Quero chegar em grupo,
lá ao cume,
para me banhar com todos,
naquele mar aberto
Cuja barra é a alegria...


ouvindo o inesgotável maestro e violinista exímio, André Rieu

o sol está rasgando a custo
as brumas  de cinza que o escondem

Berlin, 27 de Maio de 2015
6h31m
Joaquim Luís Mendes Gomes

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Correm rios

Correm rios

Ocres, azuis e verdes
correm rios
na palma da tua mão.

Há cardumes de segredos,
em torrente,
que provêm não sei donde.

Sulcam fundo. Escuros. De mistérios.

Há tormentas,
por escarpas e ravinas.
E a serena paz dos vales.

Há carícias afluentes,
que se espalham,
ora frias ora quentes,
que consolam.

Há nascentes carinhosas,
perfumadas
que enlaçam
e aproximam as distâncias.

Há alfobres de sementes,
que sobraram das colheitas
dos anos bons.

Há o regalo das saudades
da doçura de outras mãos
e doutros rios.

ouvindo Mussogsky

Berlin, 26 de aio de 2015
6h40m

o sol já queima

Joaquim Luís Mendes Gomes



domingo, 24 de maio de 2015

Força da Paz

Força da Paz

Da paz, interior e exterior,
brota a alegria,
Tudo, em nosso redor,
ganha cor.

Sonhando.
Criando.
Dando ser.
O bom e o belo.

É-se luz.
É-se fonte.
Boa semente.
Surgem os frutos.
Morre a fome e a sede.

Cresce a força
e a vontade de se dar
e benfazer.

Enfim, a vontade plena de viver.

ouvindo Claire de lune de Debussy

O dia nasceu pardacento

Berlin, 25 de Maio de 2015
6h11m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Solidão final

Solidão final

Ai de mim, se,
naquela hora de tanta fraqueza,
me visse realmente só,
entregue às minhas forças.

Se, por detrás daquela nuvem negra,
que corria rumo a mim,
não houvesse mais sol
a iluminar o meu futuro.

Se nem um cofre cheio
nem o amparo dos meus amigos
conseguissem inverter aquela ameaça...

Seria só o estertor do desespero,

ou o baixar dos braços,
até à hora final da desgraça
que a ninguém poupa,
forte ou fraco,
pobre ou rico...

Me sossegou, porém, sentir
que não estava só...

Tinha um Pai atento,
mesmo e sempre,
alii ao lado...

Berlin, 24 de Berlin de 2015
16h24m
Joaquim Luís Mendes Gomes


sábado, 23 de maio de 2015

As linguagens

As linguagens
Tudo seria um ermo,
entre os seres viventes,
sem o dom da linguagem.
Rutilantes se pavoneiam as papoilas,
bailando ao vento
e como deliciam nossos olhos.
Transmitem alegria os gritos e as gargalhadas das crianças,
nas inesgotáveis brincadeiras,
dando esperança a quem passa.
As desprendidas excursões a pé,
ora subindo ora descendo,
as encostas e os vales,
sorvendo o ar e a luz do céu,
que nos suaviza o caminhar,
mesmo que se queixem de cansaço
as nossas pernas.
Enchendo-nos de força e vontade de viver.
Contemplar os rios a correr,
ora em fúria ora brandos,
através dos leitos que rasgaram.
Nos despertam as ganas de lutar e fugir à letargia.
E as voltas incessantes
dos bailados
que descrevem pelo ar em festa,
a passarada
fazem-nos esquecer o chão
com suas asperezas,
e alcançar a doçura da vertigem das alturas.
E a viagem imparável do rodar da natureza,
em fulgurosas cavalgadas,
quer chova neve
ou faça sol.
Como a dizer que nossa vida é um fluir,
em constante mudança de cor.
E a corrente de amizades
que vão surgindo,
pelos caminhos,
qualquer que seja a nossa sorte.
Como archotes a arder
que aquecem e iluminam.
É o esplendor do encanto
de tanta forma de linguagem
que foi posto ao nosso dispor...
ouvindo Plácido Domingo e outros...
o sol já brilha alto
Berlin, 24 de Maio de 2015
6h47m
Joaquim Luís Mendes Gomes

sexta-feira, 22 de maio de 2015

misteriosa força dos impulsos

A misteriosa força dos impulsos

Há uma mola universal,
como a dum relógio,
que perpassa o mundo,
desde o que é aparente inerte,
ao tudo que vive e morre.

Um sistema oculto e complexo
de partículas que gravitam
em movimento contínuo,
quais rodas cremalheiras,

Seu princípio motriz
é a misteriosa força dos impulsos.

Na matéria, tem a invisível forma
da força magnética
que lhe sustenta a sua forma.

No mundo anímico,
é o fogo vital
que se mantém aceso,
pela força enigmática da energia.

E no reino interno da consciência,
sopra incessante o nebuloso
impulso do pensamento.

Berlin, 23 de Maio de 2015
7h29m

ouvindo os doze concertos de Albinoni

Joaquim Luís Mendes Gomes


quinta-feira, 21 de maio de 2015

O cavalo à janela



O cavalo à janela

Eu o via cada dia,
da casa onde vivi.

Formosa cabeça de olhos doces reluzentes.
Espreitando tudo como eu.

Eu via os comboios constantes,
num vai e vem.

O pinhal dormente,
uma cortina verde,
a esconder o mar ao longe.
As pequenas hortas,
com ovelhas e galinhas,
em pasto livre
e as couves altas,
verdejando em levas.

Ele, a esperar a dona.
Lhe abrisse a porta
para espernear à solta
na redonda cerca.
Felicidade total.
Se contentando com pouco.

Meu pensamento,
em remoinho,
batia as asas,
voando ao vento,
como um condor.

Berlin, 22 de Maio de 2015
7h45

Joaquim Luís Mendes Gomes



Encruzilhada polar

Encruzilhada no deserto polar

Sinto-me em pleno pólo polar.

Perdido numa encruzilhada,
perdida nesta calote branca de neve infinda.

Quero voltar a encontrar
a terra firme.

Estou só.
Incomunicável
e incomunicante.

Entre este mar de neve
e o alto céu azul.

Tenho de escolher apenas um dos quatro caminhos
da encruzilhada
traçada em cruz...

A única porta aberta
é a da alma.

Por ela entro.
Esperançado e confiante.

Prescrutando todos os seus recantos,
em busca de uma ténue luz.

Oiço uma voz que diz:

- Segue o caminho ao alto da cruz da encruzilhada.
Irei ao lado!...

Aqui eu vou.
Certo de que voltarei
à paz segura da minha casa...

ouvindo Sibélius

Berlin, 22 de Maio de 2015
6h2m

o sol vai já alto

Joaquim Luís Mendes Gomes






quarta-feira, 20 de maio de 2015

Colapso dos planetas...

Colapso total dos planetas...




A notícia explodiu na Terra
de sopetão,
Avassalou
e pôs o mundo num extremo pavor
e alvoroço.

Encheram-se os jornais e telejornais
das mais variadas  opiniões.

De letrados doutores,
de adivinhos
e de charlatães.

Pelos céus, de lés a lés,
corriam vertiginosos,
nos hemisférios,

em reais fogos cruzados,

Pânico geral.

Vai ser o fim do mundo!...

Por toda a terra,
pararam as guerras e as dispersas algazarras,

As festivas e as demais,

as que tornavam num inferno
a vivência sobre a terra.

Terrificadas, em extertor, mortal,
se avivaram
bem fundo, os temores das consciências.

Tudo especou.

Ergueram-se em preces fervorosas,

toda a panóplia de religiões,
com incensos e procissões,
se apagando de vez,
a frontal arrogância dos ateístas.

Pelos continentes,
ficaram desertas
todas as magnas assembleias das potências.

Se calaram aflitas todas as vozes
dos presidentes mais poderosos
e eminentes

Sentiu-se o real valor
e o peso da paz e da igualdade.

Se abriram todas as portas
e fronteiras.
E a Humanidade convertida,
em uníssono,
jurou jamais pegar em armas,
se entregar à paz
e à mais ardente fraternidade.

Ao ver, agora, clarividente,
enfim,
o mal do mal...
e como seria bom reviver
em fraternidade,
se não fosse de vez o fim do mundo!...

ouvindo "Planets" de Gustavo Mahler

Berlin, 21 de Maio de 2015
6h49m
Joaquim Luís Mendes Gomes

Doce regresso...

Doce regresso...

Quando já se almeja a nossa casa ao longe,
tudo acelera dentro de nós.

Estalam os olhos.
Sente-se as pancadas
do coração a bater.
Quase rebentam os pulmões.
Até os sapatos deslizam como em patins.

vêm em catadupa,
as últimas recordações da partida.
O seu sabor amargo,
revestido pela doçura
do regresso.

O nosso cheiro se expande
e vai despertar o cão fiel
que ficou à espera.

Ei-lo a correr fogoso.
Lança-se à gente,
como em desespero.

Dá-nos abraços.
Lambe-nos o rosto.
Quase caímos...

Solta lagidos.
E ladra feliz.

Dirijo-me ao poço.
Puxo a água.

Mato a saudade,
mato a sede,
quase a morrer.

Distribuo abraços.
Recebo carinho.
Minha alma acende.
Fico feliz...

No "bar dos motocas" arredores de Berlin,

ouvindo Brahms, concerto para violino e orquestra

Joaquim Luís Mendes Gomes


terça-feira, 19 de maio de 2015

Praça deserta...

Praça deserta...

Cheguei cedo à praça.
Não havia viv'alma.
Nem um cantoneiro com farda ou um varredor.

Lentamente, um por um,
Por todos os lados,
Caminhos diversos,
Toucados e vestes diferentes,
Arribavam peregrinos,
uns de cajado,
açafates em cima,
diversas propostas.
Umas coloridas,
em tons variados,
outras desmaiadas,
quase sem cheiro
ou cor.

Crescia a alegria.
O brilho sorria.
A vida vibrava.
Em ondas harmónicas,
os ânimos giravam,
a superfície um lago,
verde e garrido,
espelhando harmonia,
em partilhas,
conversas expostas
ou escondidas,
no topo das esquinas,
trocando segredos.

Se enchem os sacos.
Iguarias e bolos.
Bebe se vinho.
na lapela ou orelha,
um raminho cheiroso,
perfume silvestre.

Há arrecadas doiradas,
nos bustos trigueiros.
Negros cabelos,
corridos, se espraiam nas costas e ombros
das moças de sonho.

Elegantes coletes,
cobrem camisas de linho,
coradas ao sol.
Calças vincadas,
presas às cintas,
com cintos de couro,
ocultam as pernas hercúleas
dos artistas do campo.

Um elegante chapéu ou boné
tapam cabeças
com rostos sadios,
queimados do sol.

No pescoço,
rodam os lenços vermelhos,
cruzados no peito
ou gravatas faiscantes
às cores.

Arfam os peitos
De energia vibrantes.
E, aos poucos,
vão regressando,
pelos mesmos caminhos,
leves lá dentro,
carregados de força,
mais uma semana
de intenso labor.
De novo, a praça deserta.

ouvindo Brahms com a exímia Hélène Grimault ao piano

o sol teima em romper...

Berlin, 20 de Maio de 2015
7h29m
Joaquim Luís Mendes










humilhação das sombras...

A humilhação das sombras...
Nunca ficam coloridas,
por mais verdes sejam as folhas
ou as pétalas das flores.
Se os anjos,
de olhos azuis,
tivessem corpo,
seriam negras suas asas,
e os seus cabelos mesmo loiros.
Clamam pelo sol,
ficam agónicas,
e desmaiam
como o diabo foge da cruz.
Não têm expressão no corpo,
nem alma no coração.
De receosas,
se colam rentes,
mesmo ao chão,
ou às paredes,
se perseguidas,
com o medo de morrer.
São exímias na arte de imitar.
O seu estigma inelutável
é o silêncio soturno e negro em que vivem,
como se prisioneiras
ou num degredo...
ouvindo um concerto de Beethoven
para violino e orquestra
Berlin, em casa da Sandra,
19 de Maio de 2015
19h29m
Joaquim Luís Mendes Gomes

mergulho...

mergulho...

aquela sensaão estranha
de nos vermos num mundo estranho
e o lenitivo fresco de voltar ao nosso,

aquele impulso que nos puxa cá fora.

aquele salto à solta
que não tem regresso.

aquele instante num suspenso instante.

aquele apelo intenso
de mergulhar.
donde nos vem?

penso que foi na água,
há muito,
o nosso começo
e foi dum ventre meigo
que tudo surgiu...

Berlin, 19 de Maio de 2015
11h17m
Joaquim Luís Mendes Gomes






segunda-feira, 18 de maio de 2015

moedas e notas...

moedas e notas...

sonhar com moedas e notas.
um saco sempre a abarrotar.

ter a alma vazia
e cheia de tristeza,
é um crime e castigo.

uma vida estragada,
sem sonho.
a alegria de dar.
a surpresa que vem,
numa carta singela,
num sorriso aberto,
numa flor a bailar.

uma valsa sonora,
de noite ao luar,
um "claire de lune",
dum piano a tocar.
cheio de notas.

Berlin, 19 de Maio de 2015
7h59m
Joaquim Luís Mendes Gomes

no meu telhado...

no meu telhado...

cai chuva e sol nas telhas e janelas da minha casa.

pelos caleiros descem
e vão regar a terra.
onde semeio as melhores sementes
que guardo bem
no meu sobrado.

são minha reserva de alimento.
para mim e para dar.

me consolo pôr-me à janela,
no nascer de cada dia
e vê-las medrar, de verde,
ou sorrir de cor,
nas flores do meu jardim.

ali busco um punhado de couves
para o caldo verde,
ao meu almoço
e um braçado de flores,
para as minhas jarras.

para dar beleza ao novo dia.

me sento ao computador
como quem toma o avião.
e parto não sei para onde.
ao sabor do vento.

meditando.
contemplado.
saudando a vida bela
que enche a alma.

oiço música,
de olhos no céu.
chovem-me hinos,
com harmonia.
me ponho a pintá-los
com meus pincéis.
dando-lhe as cores
do arco-íris.
enchendo telas,
com muitas pautas.

surgem as notas,
semi-colcheias.
em acordes puros.
encho-os de letras
vestidas de versos,
do melhor brocado.

prendo-lhe uma mensagem
e lanço-os ao vento...
caiam suaves,
farrapinhos de neve,
tinjam de branco,
cubram o escuro,
com alegria,
meus amigos da terra,
ao fulgor do sol...

Berlin, 19 de Maio de 2015
6h51m
Joaquim Luís Mendes Gomes





domingo, 17 de maio de 2015

sabendo a mel...

sabendo a mel...

é doce suave o ar da manhã,
sabendo a mel,
depois duma noite serena,
de sonho.

o corpo saltando de força
e sedento de vida.

correr ou andar,
entre o arvoredo,
o canto das aves.
o gorgolejar das águas dum rio.

ver os cisnes bailando com graça,
arcos de valsas,
palácios de vidro,
espelhando d'azul
e de verde até à orla do bosque.

encontrar a labuta da vida,
em carros correndo,
cheios de gente dormente
que vai trabalhar.
horas a fio.
sustento dos seus.
que a esperam no lar.

camiões carregados,
fluindo a correr,
alguém os conduz,
com destino,
às horas marcadas.

operários, doutores,
de rostos serenos,
as mãos no volante,
tratam das árvores,
reparam as estradas,
servem nas escolas,
as artes que sabem,
semeando sementes,
garantindo o futuro,
enriquecendo as mentes
dos miúdos que brincam
e querem crescer.

é a festa da vida
que não pode parar...

Berlin, 18 de Maio de 2015
7h33m

ouvindo Chopin

Joaquim Luís Mendes Gomes

gritar aos quatro ventos...

gritar aos quatro ventos...

gritar, de manhã à noite,
aos quatro ventos,
sem ouvir alguém.
daqueles mesmos
que não fazem mais nada senão espoliar.

clamar socorro ao mundo
e receber a indiferença total
e até o escárnio...
- arrumem vós a casa
e se ponham a trabalhar!...

sabendo nós que é só para eles
que foi e vai
tudo o que tínhamos e já perdemos...

como escravos que uma democracia falsa
soube criar...

é de enlouquecer
e de chorar...

Berlin, 18 de Maio de 2015
00h19m
Joaquim Luís Mendes Gomes


nasceu um poço...

nasceu um poço...

quando cheguei da guerra,
tinha amealhado uns trocos.

peisava de água à farta,
lá para casa.

contratei o sr. Barbosa.

um dia, de manhãzinha,
se apresentou ele.

uma picareta,
uma pá
e um sarilho.
tudo um carro de bois.

pegou num molho de  varas.
pô-las em arco.
uma mão em cada ponta.

andejou, andejou
pelo quintal.

até que, por arte mágica,
elas arquearam!...

- é aqui.
e há muita água.

riscou no chão um círculo.
com umsimples cordel.

diâmetro: metro e meio.

pegou na pica.
cuspiu nas mãos.
pôs-se a picar.

e pá a pá,
e pica a pica,
se afundou no chão,

enchendo o balde,
com a terra picada.

e o petiz ajudante,
manivelando o sarilho,
a balde a balde,
ergueu uma montanha,
até que um grito forte
eclodiu do fundo,
 a uns dez metros:

- nasceu a água!
muito abundante...

ó que alegria!...

Berlin, 17 de Maio de 2015
20h8m
Joaquim Luís Mendes Gomes

um ovo a cavalo...

um ovo a cavalo...

nunca imaginei a força e o encanto dum ovo a cavalo...

cada poema que escrevo
e partilho
é como um ovo a cavalo,

com clara e com gema.
um pouco de sal,
pimenta,
um pouco de amor,
vai matar a fome,
longe, não sei de quem...

eles mo dizem.

fico radiante.
já não tenho mãos a medir...
para os que queria levar.

afinal, ó que surpresa!...

tanta aparência
de opulência,
morrendo de fome...

Berlin, 18 de Maio de 2015
1738m
Joaquim Luís Mendes Gomes

sábado, 16 de maio de 2015

A Fé...

A Fé...

Não é um talento que se tem ou não,
desde a nascença.

É uma capacidade e uma outra luz que se adquire,
não com esforço,
mas por prece
ou simples dom.

Permite ver para além da luz do sol
e de todas as aritméticas
ou astrofísicas.

Não é uma miragem
nem uma quimera.

Tem a força ingente
de mover montanhas
e separar as águas,
como o frio de gelar uma catarata,
nem que seja a de Niagara...

A religião não é uma invenção do espírito.
É uma dimensão que liga o hmem
ao seu Criador...

Deus não é um produto.
Que se vende, se compra ou se impinge,
para encher, esvaziar ou distrair.

Como as artimanhas todas
que o homem engendra,
sejá lá qual for o fim,
bom ou não.

É um laço terno e firme.

Liga a obra a quem a cria.

Prende Deus à Humanidade por uma corrente de Amor.

Só a Fé a permite ver...

(a propósito duma digna controvérsia onde eu estive e onde não funciona a força dos argumentos...)

ouvindo concerto para violin e orquestra de Mendelsson

o dia já vai alto

Berlin, 18 de Maio de 2015
8h8m
Joaquim Luís Mendes Gomes


vã glória...

Glória vã…

É tão fugaz a vida da glória,
Por qualquer feito,
Que, no momento, enche a alma,
Mas depressa se esfuma.

Como amarga é
A experiência inesperada da derrota.

Quando tudo assenta só
na força que se sente…
o ideal estará
em saber ganhar
e saber perder,
com a mesma humildade simples.

E ter presente que tudo o que temos,
Não é só nosso ,
Mas sim a soma certa
Do que damos
e do que nos deram…

Berlin, 16 de Maio de 2015
22hh41m

Ouvindo uma final de “Stars”, na RTL

Joaquim Luís Mendes Gomes


sexta-feira, 15 de maio de 2015

lettargia fenomenal...

letargia fenomenal...

mesmo com todo este progresso aparente,
quando se conseguiu chegar à Lua e até a Marte,
e dar, num dia, a volta ao mundo.

se comunicar na hora,
tudo que se queira e exacto,
para outrem,
lá nos confins da selva
ou do deserto.

se faz a clonagem perfeita de seres viventes,
e o transplante de quase tudo,
do nosso corpo.

se erguem aos céus
grandes bizarmas,
à velocidade supersónica,
e se põem a flutuar serenos,
nos oceanos, tormentosos,
verdadeiras cidades,
metidas dentro duma simples barca.

e se tenham desvendado muitos segredos,
na composição de toda a matéria,
suas órbitas e consistência.

se põem a mil à hora,
longos trens em euforia,
através dessas lonjuras,
de continente a continente.

- ó meu Deus!...

porque grassa uma infinita letargia,
de terríveis consequências, nas consciências supremas de quem manda...


com tamanha indiferença
aos milhões de irmãos,
que nascem
e vivem com tanta fome,
tanta dor e sofrimento
que os leva à própria morte...
se nunca fizeram nenhum mal!...

até apetece questionar:

- onde está o Deus justo e bondoso criador?...

se não fosse grande a nossa fé e a nossa esperança!...

ouvindo Smetana em Moldava

Berlin, 16 de Maio de 2015
6h11m

o sol ardente e luminoso já vai alto

Joaquim Luís Mendes Gomes

cálice de vinho....

o cálice de vinho...

saído mosto
do ventre da uva,
pura e casta,
amadurecida ao sol.

barro da encosta
da terra virgem.
num vale suave,
voltado para o rio.

traz oculta,
a expressão maior
do maior artista.
que é a alegria.

a força vital.
que movimenta o mundo.

sem ela há a sombra
e o gelo do frio...
enregelam as almas,
se apaga a chama,
que o amor aquece.

dá-se o eclipse total
vai-se a esperança.
e não há mais sol
que a reverdeça.

não foi acaso a escolha de Cristo,
naquela ceia,
naquela mesa de amor
que salvou o homem
e transfigurou o mundo...

Berlin, 3 de Fevereiro de 2015
7h8m
madrugada a nascer vestida de branco...
Joaquim Luís Mendes Gomes






soneto final...

poema final ...

estão a fechar as portas
deste dia de sol.

quem saíu e não voltou.
para uns, o fim
para outros, começo.
para outros, mais um.

memórias.
anseios.
sonhos.
paixões.
alegrias.
tristezas.
saudades.
esconjuros.

compassos de espera.
promessas e juras.

narrativas
e histórias.
lendas.

derrotas.
vitórias.
miragens.
e tudo existe oculto
ou ao sol,
tudo ficará,
como um testamento,
num poema
quando o último dia vier,
meu poema final...

Berlin, 15 de Maio de 2015
11h20m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quinta-feira, 14 de maio de 2015

música no ar...

anda poesia no ar...

como ave colorida,
como nuvem de chuva,
como céu de estrelas,
como jardim de cores,

ora princesa,
ora rainha,

milagre de rosas,
coroa de espinhos,

barco de amor,
favo de mel.

ilha de amores.
casebre de bosque,
palácio de luzes.

navio à vela,
nauta perdida.

ora prisioneira,
sereia fugida.

basta chamá-la...
quando ela passar.

Berlin, 15 de Maio de 2015
8h20m
Joaquim Luís Mendes Gomes

minha ilha...

minha ilha...

não quero ficar para sempre,
na minha ilha,
ainda que seja linda,
cercada de
céu azul e mar sem fim.

lindas montanhas,
altas ravinas,
vestidas de cores,
muitas flores,

uma rede estradas e túneis,
que me levem depressa,
duma ponta à outra...

quero sentir o mundo,
por terra firme,
ao meu alcance,
saltar as fronteiras,
outros matizes,
de cor e luz,

gentes diferentes,
novos saberes,
modos de estar.
onde a felicidade habita,
seja no campo,
seja na serra,
ou no formigar
duma cidade.

outros falares,
os mesmos sorrisos
e brilhar de olhos.

pequenas ermidas,
catedrais enormes,
majestosas torres,
lindos vitrais,
padroeiros à escolha,
advogados no céu.

mares de searas,
outras sementes.
vinho e azeite,
favos de mel,
urzes nos montes,
vales com rios.

sentir o prazer da saudade,
que me comece a puxar,
me volte suave
a doce vontade de regressar...

ouvindo André Rieu...

Berlin, 15 de Maio de 2015
6h8m

nasceu luminoso o dia

Joaquim Luís Mendes Gomes

oxalá sobreviva...

oxalá sobreviva...

não posso rasgar...
saíu do fundo, como tantos outros que escrevi.

se a eles eu expus à luz,
a estes também não vou negar.

sei lá se há alguém
que deles careça,
ou lhes faça bem...

maldigo veementemente,
a madrugada de Abril,
pelo tanto que prometeu
e o muito que enganou.

havia fome.
havia sede.
de paz.
educação e assistência.

da liberdade total
de comunicar.

impunha-se apenas,
respeitar a herança,
conforme fosse a vontade
de todos os herdeiros,
de cá e além-mar.

sem atropelos.
manter os laços
e estreitá-los com todo o respeito.

o que aconteceu naquela noite
foi o derrubar duma barragem...

o lançar ao vento,
à sorte e à voragem
duma horda,
externa e interna,
de energúmenos,
tão só ávida da nossa riqueza
e da vã glória de mandar,
em proveito póprio.

desrespeitando o mais sagrado
que fez de nós uma secular nação...
pô-la à morte.
oxalá sobreviva...

Berlin, 14 de Maio de 2015
23h53m

Joaquim Luís Mendes Gomes


quarta-feira, 13 de maio de 2015

doçura e asperezas da vida...

a doçura e a aspereza da vida...

que monotonia seria a permanente serenidade do mar sem ondas...

apenas um morto azul,
sem o abundante respirar do vento,
onde não velejariam caravelas.

e a nossa terra imensa e ronda,
sem as serras cheia de picos
e a branda correria das montanhas,
sem a garrida formosura dos seus vales.

e o fogoso correr dos rios,
desde lá dos píncaros,
sem o sobressalto agreste das cataratas,
e o fragor das rochas.

onde o amor e atenção aos outros,
se nosso viver de cada dia
fosse sempre um mar de rosas.

onde a maviosa sedução  dos sonhos
se o nosso viver tivesse a pobreza cega dum programa.

oh que tédio!...
só que custa e faz sofrer
tem verdadeiro valor
e nos dá gosto...

ouvindo o portentoso jovem tenor Roberto Alagna

Berlin, 14 de Maio de 2015
6h49m

nasceu tristonho o dia

Joaquim Luís Mendes Gomes

as horas não dormem...

As horas não dormem...
em passadas certas,
vêm do começo do tempo,
ao sabor dos astros.
Umas vezes, aves agoirentas.
outras, radiosas.
se entranham no nosso mundo
e nas nossas vidas.
ficam marcadas.
ficam gravadas.
com contas certas.
guardam memórias.
deixam saudades.
carregam tristezas.
promessas futuras.
ameaças medonhas.
correm o mundo,
batendo às portas,
nunca sossegam...
Berlin, 13 de Maio de 2015
21h21m
Joaquim Luís Mendes Gomes

segunda-feira, 11 de maio de 2015

seara de rostos...

tantos rostos que passam...

tão variados.
de todos os lados.
enchem as praças,
passeios e ruas.
uns do oriente, perto e distante.
outros do norte,
olhos e tês,
sombrios, claros.

caracóis nos cabelos,
cabelos corridos.
barbas hirsutas.
grisalhas e brancas.

olhos redondos,
de todos os tons.
pérolas, rubis.
celestes de azul.

lábios de púrpura.
sobrancelhas,
sobrolhos,
carregados de luz.

de todos conheço
exemplos iguais.
cruzam caminhos e sendas
no meu país,
semeado de raças...

Berlin, 12 de Maio de 2015
8h00m
Joaquim Luís Mendes Gomes

andam no ar...

andam no ar...

passam no ar tantos poemas.

me ponho a vê-los
e escolho um.

o mais belo, bom e lindo
para oferecer aos meus amigos.

- ali vai um!
corro ...

bate-lhe o sol
seus versos luzentes
inebriam meus olhos.

entram em mim
me enchendo o peito.
o coração se acende
e o pensamento,
uma fonte nascente,
dita estas letras,
cheias de amor.

aqui vão no vento,
saciem a fome.
matem a sede.
sirvam sustento,
de paz e de bem.

levem a esperança
de melhores dias.
sosseguem quem sofre
e sarem as feridas.

as que se vêm por fora,
mais as escondidas.

abram as portas,
fechadas há muito,
ao vizinho da frente,
àquele do lado.

sejam traineira,
esbordando de pesca,
regalo das mesas,
de alegria.

que suas letras singelas,
pétalas de rosas,
larguem perfume
encha as casas...

Berlin, 12 de Maio de 2015
6h39m

o sol já brilha alto e aquece

Joaquim Luís Mendes Gomes

sonho de piano...

sonho de piano...
serão das cordas,
será das teclas,
brancas pretas,
aqueles acordes lindos,
e gorjeios brandos,
que se erguem em labaredas,
nuvens albas,
de sons e luz,
a brandir Chopin?...
ouvindo "preludes" de Chopin
Berlin, 11 de Maio de 2015
23h50m
Joaquim Luís Mendes Gomes

gaivota...

Gaivota...
serão das guitarras ou da voz de sonho,
estas lágrimas, estes lamentos
que escorrem dentro de mim?
ou será do fado que me enche,
como o Tejo beija Lisboa....
perco de vista
os cacilheiros,
num eterno vai e vem.
nunca me canso de ver a ponte
e as velas de belém...
como são lindas estas colinas,
onde se banha nossa lisboa...
ouvindo uma Gaivota , na voz e alma da nossa Amália imortal
Berlin, 11 de Maio de 2015
9h13m
Joaquim Luís Mendes Gomes

domingo, 10 de maio de 2015

o mar no céu...

aquele mar no céu...
nasci ao pé do mar.
será alucinação.
mas vejo o mar no céu.
onde vagueiam as nuvens,
coo se fossem caravelas.
me chega azul a brisa
e a espuma das ondas ferventes,
do nascer ao por do sol.
e, às vezes, as tempestades.
e aproveito as calmarias,
para dar os meus passeios.
num balão ardendo em sonhos.
vejo as serras e vejo os rios,
entre fragas, vales fundos,
em tão loucas correrias,
adormecendo, de tão cansadas,
ao pé dum mar de pradarias,
onde se eleva minha varanda.
que me deixa ver o mar...
Berlin, 11 de Maio de 2015
7h19m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quando saio à rua...

quando saio à rua...

vejo a vida a fervilhar.
sempre diferente.
alguém que espera o autocarro.
o que dedilha o telemóvel.
o que corre para cultivar o corpo.

o que vai desembaraçado,
mochila às costas,
para o seu trabalho.

o camião que abastece o supermercado.
com condutor que faz de tudo.
com uma perna às costas.

a padaria que serve o pão quente
atrás do balcão e tem cá fora uma esplanada.

a mulher turca, de vestes largas,
alheia aos olhares
e vivendo Alá...

os garotos que vão para a escola,
comendo um pão,
ou mascando chiclet.

o ancião vetusto,
mas ainda autónomo,
cadeira à frente,
serve de bengala
e transporta as compras.

ni meu país,
se ainda não morreu,
ou joga as cartas
ou vegeta asilado...

Berlin, 10 de Maio de 2015
21h18m
Joaquim Luís Mendes Gomes

sábado, 9 de maio de 2015

amanhecer...

o amanhecer...

cada dia novo
é um livro que se escreve.
com versos de alegria e tristeza...
como o tempo,
luzente ou acinzentado.

traz prendas ou surpresas
que nos encantam ou nos ferem
e deixam ferida.

há sorrisos e esgares
de olhares sisudos.
só Deus sabe o que vai lá dentro.

há as cores a brilhar ao sol,
nas flores,
sempre expostas,
sempre presentes
e nos sorriem.

há favores de bem
que nos fazem
e nós também
a quem nos pede.

uma carta inesperada
com o abraço longínquo
que se ansiava...

há juras e promessas
daqueles dias,
quando passam,
deixam saudade...

Berlin, 10 de Maio de 2015
7h17m

nasceu cinzento

Joaquim Luís Mendes Gomes

alucianação das multidões...

A Alucinação das  Multidões

Ninguém consegue enfrentar a multidão
Que bate palmas
Que urra e ladra,
Ao redor dum campo de bola,
Como um jumento
Ou um cão.

O bom senso e a inteligência
Que crescem e que há em cada um,
 Não se adiciona como os números:
Um mais um igual a dois…!

Se assim  o fosse,
Certo seria:
 - Não haveria tanto estádio
E o que houvesse,
Nunca encheria assim,
E se enchesse,
Logo ficaria deserto…
As mais das vezes
Ao somar a resposta certa de cada um,
 À mesma questão:
- que faço eu aqui, ao certo,
se não a encher a carteira estéril
Dos espertalhões,
Que mais não fazem
Que vender caro tamanha ilusão…
Fabricando escravos,
Que parecem heróis…
Atrás da bola,
Aos pontapés!

Ainda se fosse de trapos
E de chimpanzés!?...
Seria um circo
E uma nobre arte,
Sem confrontação,
O futebol…
A de divertir a multidão,
O que é bem preciso!

Ovar,26 de Agosto de 2012
4h 25m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes