quinta-feira, 31 de março de 2016

sombra negra...

Oiço uma sombra tão negra

Oiço uma sombra tão negra
nessa tua voz de luz.

Parece que é o vento a cantar.
Só não sei o que me diz.

São baladas tão tristes.
Só me apetece chorar.

Partiu tão tenro e menino.
Morreu-me a alegria no mundo
Porque toda a riqueza levou...

Mafra, café Caracol, 31 de março de 2016
16h9m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

neste campo de pedras...

Neste campo de pedras...
Neste campo de pedras,
- Já foi um campo lavrado
com muito milho maduro -
dorme um menino tão lindo
que morreu a brincar.
Era um botão em flor...
Ovar, 29 de Março de 2016
15h25m
Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

as vogais da tua voz...

As vogais da tua voz...

Tua voz não tem vogais.
Só consoantes.
E quando as tem,
são tão átonas.
De tão distantes.

E as consoantes são sempre ásperas.
Não têm ditongos. Coloridos.
E quando os tem,
são tão nasais,
fazem espirrar...

Bar "Caracol" 31 de Março de 2016
15h13m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

vou pedir à música...

Vou pedir à música...

Pode ser encontre.
Preciso tanto...
Nem sei bem dizer.
Há um vazio em mim .

Reclamando.
Será de luz?
Será calor?
Fome e sede...
Sei lá de quê.

Meu ser incompleto.
Tem sombras leves.
Interrogações.
Espaços vazios.
Janelas abertas.
Paredes sem nada.

Precisam de telas,
com cor e vida.
Fotos antigas.
Vidas passadas.

Outros mundos.
Rios correndo.
Bordas de mar.
Promontórios altos.
Escarpas a pique.
Com muitas nervuras.

Desertos de sal.
Salinas ao sol.

Barcos bailando.
Portos de pesca.
Muitas vareiras.
Pernas à mostra.

Algas estendidas.
Cheirando a mar.

Noitadas de festas.
Fogos de cores.
Bazares de música.
Concertos reais.

Searas de vento.
Vales sem fim.
Ondulações de serras.
Aldeias espalhadas.

Carreiros com gente.
Ribeiros correndo.
Campos de milho.

Fecho meus olhos.
Ponho-me a ouvir.
Minha alma sobe.
Sinto-me bem!
Graças a Quem?...

5ª sinfonia de Beethoven

Mafra, 2 de Abril de 2015
7h18m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quarta-feira, 30 de março de 2016

branda e doce...

Branda e doce caía a tarde
naquela idade,
quando, à volta, tudo sorria.

Havia abraços 
e havia beijos
em toda a parte
onde se chegava.
Fora e dentro da família.

Eram os Avós de ambos os lados.
Eram os tios.
E a vizinhança.

Quando as portas de todas as casas
se mantinham sempre abertas,
a qualquer hora.
Se entrava e se saía.
Como se de casa...

Como tão cedo e tão depressa caíu a noite...

é escasso o tempo...

é escasso o tempo...

matéria-prima,
rara.
que tudo domina.
sabe a infinito.

às vezes, chove.
por vezes, venta.
traz a alegria.
também a desgraça.

o sol o aquece.
o ilumina atento.
dá-lhe o azul,
também o verde
e o pardacento.

não se pode perder.
cada momento que passa
não volta a passar,
precioso demais...







terça-feira, 29 de março de 2016

amigo antigo...

cada vez que se encontra...
um amigo antigo
que há muito não se via,
há um mergulho
no passado.
bom ou não,
conforme a história
o registou.
tantas horas da mesma marcha,
lado a lado.
os mesmos anseios.
os mesmos receios.
ora sonhos,
ora pesadelos.
pedaços de nós.
compartilhados.
ficaram para trás.
pareciam perdidos.
viviam nas mentes
de cada um de nós.
não há indiferentes.
como parecia ter sido,
quando decorria a marcha.
tudo emerge.
já decantado
de todas as sombras
que faziam sofrer.
impera a saudade.
tempo vivido.
comum de tantos,
com tantas cores.
só se miram agora.
com realidade.
Mafra, 29 de Março de 2015
19h35m
final da tarde
a propósito dum recém-grato encontro...
Joaquim Luís Mendes Gomes

segunda-feira, 28 de março de 2016

a real realidade...

A real realidade...

Uma coisa é a cara,
sombria e cerrada,
da pessoa que passa.

Como se alheia e distante.
Parecendo sem interesse,
A quem passa.

E, de independente,
Todo o mundo fosse seu.

Como é diferente o que vai lá por dentro.

Desde o receio
de desagradar.

Passar despercebido.
Nada merecer,
senão indiferença
ou malquerença.

Porque sou pequeno.
Uma cara sem graça.
Um pobre de tudo.
Um sem interesse.

- oxalá aquele-aquela goste!
- que pense bem
e me deseje...

- que pena!
- nunca mais o-a vejo...

- dar-lhe-ia tudo...
pelo bem do sua amizade!...
- assim ele ou ela
de mim o soubesse...

Que minha vontade seria sorrir
e não sofrer...

Quem adivinha a beleza do mar no seio,
se só por cima o mira?...

Berlin, 3 de Maio de 2015
8h32m
Joaquim Luís Mendes Gomes

mar de gaivotas...

mar de gaivotas...
sobrou na areia,
na borda do mar,
um manto de penas.
molhadas.
foram gaivotas.
caíram cansadas
de tanto voar.
já não davam para nada.
levaram.-nas as ondas.
pareciam formigas,
para servirem de cama,
nos fundos do mar...
Ericeira, 28 de Março de 2015
18h31m
ao cair da tarde
Joaquim Luís Mendes Gomes

domingo, 27 de março de 2016

branca e pura...

Branca e pura...

Branca e pura como a neve
é esta sinfonia.
Um hino à luz e à vida.
Onde acontecem as auroras boreais
E as veredas percorrem as florestas verdes
em sinuosos arabescos.

Onde os ursos correm meio mundo
pelo pão das suas crias..
Onde  o sol nunca consegue aterrar na terra nem no mar.
Com medo de apagar-se.

Os ventos sibilam agudos
entre os troncos esguios e elegantes.

Onde há rezas  melodiosas
nas noitadas de lua cheia.

Vêm dos pólos longos comboios de gazelas brancas.
Nuvens de cinza gelada
saem das copas em chaminés.

Aqui me quedo à espera,
Até que de novo eu veja e sinta.

ouvindo Filândia de Sibelius

Bar "Caracol" 27 de Março de 2016
18h33m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

andorinhas polares...

Andorinhas polares...

Arribaram serenas em bandos,
saudosas as andorinhas polares.

As esperavam seus ninhos,
os mesmos.
Nos vãos dos telhados.

Ficaram sombrios sem elas.
Não mais seus gorjeios alegres.
Nem aqueles arcos de voos.
Esmerada elegância.
Sem escola.

Até as crianças da escola,
tristonhas,
perguntavam aos pais.
- Quando é que chegam outra vez?...

Fluem candentes nos leitos dos rios
As águas da chuva que vieram das serras.
Nas encostas dos montes
e vastas searas, voam as cigarras, malucas,
em busca de grão.

Caem altivas, sonoras,
das sineiras da igreja,
as badaladas constantes das horas.

Lentas e mudas sobem os bandos de vacas
pelas mantas dos montes.

E lá mesmo no cimo,
bailam ao vento,
sem fim, as velas moleiras.

ouvindo "sinfonia nº 2 de Sibelius"

Tarde soalheira de Páscoa

Bar "Caracol" arredores de Mafra
27 de Março de 2016

Minha Mãe, hoje, faria cem anos...

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

que estampido medonho!...

Que estampido medonho...

No silêncio escuro do bosque,
ouviu-se um estampido.
As feras com medo fugiram.
Se tresmalharam à volta.
Chegaram às aldeias.
E as gentes dormentes
se estarreceram de medo
e fugiram ...

Umas escalaram montanhas.
Outras se abrigaram nas ínsuas verdes do rio ao pé.

Uma trovoada tonitruante
irrompeu pelos céus.
Os raios caindo, rasgaram as nuvens
e uma torrente de chuva caíu.

Tudo inundou.

Uma enxurrada inclemente descarnou as encostas da serra
e precipitou tudo à frente,
para aquele rio que dormia sereno
e acolhia as gentes.

Em algazarra feroz,
o rio começou a correr,
arrastando adiante,
os troncos das árvores tombadas,
mais as gentes despidas,
como se folhas e ramos caídos...

Que infortúnio tão grande
caíu sobre aquele mundo
sereno que vivia em paz!...

ouvindo Brahms, concerto nº 1 para piano

Bar "Caracol" arredores de Mafra,
16h52m

está sol, Domingo de Páscoa

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes



sábado, 26 de março de 2016

primeiras trovoadas...

Primeiras trovoadas...


Puxadas pelo vento Suão,
vieram aturdidas,
as primeiras trovoadas.

Ribombam no céus trovões famintos.
Chovem raios de fogo,
atravessam as nuvens escaldadas do verão.

Há uivos assustados pelas serras,
dos lobos fugitivos.

Se esgaçam os ramos hercúleos que secaram.
Correm velozes as águas em catadupa,
Rasgando as terras ressequidas.

Harpejam pelos ares,
em bandos numerosos,
todas as aves que ali viviam entrelaçadas.

Se tresmalharam dos pastores pelas encostas
os rebanhos de ovelhas tão pacíficas.

Chegou a hora de fugir,
em debandada.

É o furor feroz da tempestade em liberdade...

Bar "Caracol" 26 de Março de 2016
15h44m

chove...

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

brandamente...

desço brandamente...

me ponho a caminho do indefinido.
não estudei o mapa.
não levo bussola.
só levo dentro
um lume a arder
que me alimenta.

quero ser eu nestes passos firmes.
minhas pégadas serão meu testemunho.

o que faço
é por bem e bem de todos.
não recalco em mim,
meus sentimentos.
minha voz canta.
pássaro à solta.
trinados puros,
hinos de amor...

ouvindo moonlight de Beethoven
por Hélène Grimaud ao piano


Bar "Caracol" arredores de Mafra

26 de Março de 2016
11h44m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

não vem do nada...

Não vem do nada...

Que suave e linda melodia doce
sai daquele piano em fogo,
aos toques certos daqueles dedos em chama!...

Tem de haver uma fonte, algures.
Incansável e inesgotável,
o sol nasce em cada dia,
inundando a terra,
com vida e força.

Que mar imenso nos banha a todos, nos encanta
e não se vê.

Entra em nós e nos fecunda...

ouvindo
Uma Balada de Chopin, por Hélène Grimaud ao piano

Bar "Caracol" arredores de Mafra, 26 de Março de 2016
10h54m
Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

emoção...

A emoção...

Que onda suave e leve vem e banha este meu corpo triste e desesperado,
que tudo acende.

A bruma se desfez e a alegria jorra
duma fonte oculta.

O sol rebrilha.
Se incendeiam fortes as minhas forças, em labaredas.

E, num balão pleno, me lanço ao vento
Como um corsário.

Jamais se apague esta chama a arder que em mim ardia oculta...

ouvindo Hélène Grimaud tocando Bach

dia de chuva

Bar "Caracol" arredores de Mafra,
26 de Março de 2016, 10h35m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes





as horas não dormem...

As horas não dormem...

Em passadas certas,
vêm do começo do tempo,
ao sabor dos astros.

Umas vezes, aves agoirentas.
outras, radiosas.

Se entranham no nosso mundo
e nossas vidas.

Ficam marcadas.
Ficam gravadas.
Com contas certas.

Guardam memórias.
Deixam saudades.
Carregam tristezas.
Promessas futuras.
Ameaças medonhas.

Correm o mundo,
batendo às portas,
nunca sossegam...

Berlin, 13 de Maio de 2015
21h21m
Joaquim Luís Mendes Gomes

sexta-feira, 25 de março de 2016

ciladas...

Ciladas...
Quem não foi apanhado,
uma que fosse,
numa cilada,
grande ou pequena,
ao longo da vida?
Nascemos sem contar,
dum cruzamento
entre um homem e uma mulher.
-Porquê a mim?
Ó que cilada!
Se goste ou não,
nunca mais
nos livramos dela...
E não aprendemos!
E, depois, na hora,
à traição
ou então vingança,
se não houver cuidado,
tropeçamos noutra
e bem pior...
se é no altar.
Ó que azar!
A seguir o carro,
novinho em folha.
Tudo levou.
Não havia seguro!...
E no fim, a funerária.
Tudo rapou
a quem cá ficou.
Ó escalafrária!
Última cilada...
Bar "Caracol" arredores de Mafra
25 de Março de 2016
10h20m
Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

vou sair para a rua...

Vou sair para a rua...

Não me conformo com a inércia.
Saio à rua em procura de movimento.
Quero agitar a minha mente.
Sacudir-lhe o pó que entrou pelas frestas do meu telhado,
Com este vento impertinente.

Vou correr o mundo,
buscando a fundo.
Hei-de encontrar em fuga,
aqueles sons e versos
do poema bom e belo
que quero ofertar.

Aqui parado é que não fico...

Mafra, 25 de Março de 2016
6h48m

Jlmg

quinta-feira, 24 de março de 2016

às profundezas...

Às profundezas...

Desço às profundezas da minha alma,
em busca da fonte pura,
Onde jorra a água cristalina da verdade.

Os mais elementares princípos firmes
que dão a segurança
Como a quilha de aço dum navio gigantesco,
cravado ao fundo

E do leme que me dá a orientação do norte.

Quero arribar seguro,
Sem me distrair com miragens falsas,
de verdades que nunca o foram nem o serão.

Se o conseguir, serei o meu herói.
Minha glória o meu triunfo...

ouvindo Wagner, Tanhauser, com Karayan

Bar Caracol, arredores de Mafra
24 de Março de 2016
10h25m

Jlmg

Joaquim Luís Mendes Gomes

linguagens...

As linguagens

Tudo seria um ermo,
entre os seres viventes,
sem o dom da linguagem.

Rutilantes se pavoneiam as papoilas,
bailando ao vento
e como deliciam nossos olhos.

Transmitem alegria os gritos e as gargalhadas das crianças,
nas inesgotáveis brincadeiras,
dando esperança a quem passa.

As desprendidas excursões a pé,
ora subindo ora descendo,
as encostas e os vales,
sorvendo o ar e a luz do céu,
que nos suaviza o caminhar,
mesmo que se queixem de cansaço
as nossas pernas.
Enchem-nos de força e vontade de viver.

Contemplar os rios a correr,
ora em fúria, ora brandos,
através dos leitos que rasgaram.
Nos despertam as ganas de lutar e fugir à letargia.

E as voltas incessantes
dos bailados
que descrevem pelo ar em festa,
a passarada
fazem-nos esquecer o chão
com suas asperezas,
e alcançar a doçura da vertigem das alturas.

E a viagem imparável do rodar da natureza,
em fulgorosas cavalgadas,
quer chova neve
ou faça sol.
Como a dizer que nossa vida é um fluir,
em constante mudança de cores.

E a corrente das amizades
que vão surgindo,
pelos caminhos,
qualquer que seja a nossa sorte.
Como archotes a arder
que aquecem e iluminam.

É o esplendor do encanto
de tanta forma de linguagem
que foi posto ao nosso dispor...

ouvindo Plácido Domingo e outros...

o sol já brilha alto

Berlin, 24 de Maio de 2015
6h47m
Joaquim Luís Mendes Gomes

quarta-feira, 23 de março de 2016

lágrimas de sangue...

Escorrem lágrimas
Nas janelas das casas todas,
Por essa Europa fora...

São de sangue raiadas.
Têm a dor extrema
Nelas entranhada.
Pelo ódio sanguinário.
De fanáticos cegos.

Muito piores que feras.

Em nome dum Alá
Que não existe.

Esse é Amor...

ouvindo Chopin

Bar "Caracol", arredores de Mafra
23 de Março de 2016
9h16m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

anda poesia nos ares...

Anda poesia no ar...

Como ave colorida,
como nuvem cheia de chuva,
como céu cheio de estrelas,
como jardim exalando cores,
ora princesa,
ora rainha,
milagre de rosas,
coroa de espinhos,

barco de amor,
favo de mel.

Ilha de amores.
casebre de bosque,
palácio de luzes.

Navio à vela,
nauta perdida.
Ora prisioneira,
sereia fugida.

basta chamá-la...
quando ela passar.

Berlin, 15 de Maio de 2015
8h20m
Joaquim Luís Mendes Gomes

terça-feira, 22 de março de 2016

devassando o nevoeiro...

Devassando o nevoeiro...

Me lanço ao mar apesar do nevoeiro.
Com a lucidez dum farol potente.
Como um avião veloz
que rasga as nuvens
e chega ao sol.

Minha alma sente  o fulgor da claridade.
Não se atemoriza com a escuridão dos mares.

domingo sem missa...

Domingo sem missa...

Houve tempos em que Domingo sem Missa
era uma doença.

Tudo se muda.

Hoje, dia sem escrita,
é uma tristeza.

A gente habitua-se ao bom.
Um dia ele falta.
Se fica apardalado.
Parece o fim de tudo.

Somos assim.
Uns exagerados.
No fundo, uns insatisfeitos.

Sempre a chorar o que está para vir...

Bar Castelão, centro de Mafra, 22 de Março de 2016

10h2m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

aeroportos...

os aeroportos...
são terramotos de rostos diversos.
falares desconexos.
os mesmos olhares.
linguagem comum.

sempre em mudança.
me sinto formiga,
sem forma nem peso.
uma folha sem nada,
caída no chão.
me esqueço do corpo.
só sinto a alma.
pairando assustada.
afinal, o espaço é imenso.
mesmo sem mim.
Mafra, 22 de Março de 2015
13h21m
Joaquim Luís Mendes Gomes

segunda-feira, 21 de março de 2016

destroços...

Destroços…
Depois da tempestade,
A bonança e os destroços,
Espalhados no chão.
Vão os telhados.
Caem os ramos.
Entopem os canos
Das enxurradas.
Faz-se contas à vida.
Ao que sobrou.
Se apaga a tristeza.
Se secam as lágrimas.
Renascem as forças
Se arregaçam as mangas.
E a vida retoma.
Tudo é passado.
O futuro começa.
Cada dia igual
Ou melhor.
Se constrói o progresso.
Que a todos interessa.
De preferência para o bem.
Já chega o cansaço
De subir e descer.
A viagem só para
Quando Deus o quiser.
Berlin, 7 de Dezembro de 2014
8h48m
Joaquim Luís Mendes Gomes

domingo, 20 de março de 2016

tratando da horta...

Tratar da horta...

De sacho na mão,
Cavo minha horta,
Cada manhã.

Revolvo a terra.
Exponho-a ao sol.
Lanço a semente.
Água fresquinha.
Imploro uma reza.
E fico à espera,
A ver o que dá.

Nunca tardou.
Na hora, aparece um rebento,
Cheio de esperança.
Põe-se a crescer,
Fugindo para o ar.

Surgem as folhas,
Na ponta dos ramos.
Rebentam flores
Com sede de luz.

Às duas por três,
Minha horta é um jardim
Que apetece contemplar.

Milagre da vida,
à frente dos olhos.
Só não vê quem não quer.

Bendito Senhor!...

No Bar Caracol, arredores de Mafra,
olhando para Sintra

20 de Março de 2016
9h29m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

sábado, 19 de março de 2016

pressinto ondas no ar...

Pressinto ondas no ar...

Andam ondas no ar.
Chamando...
As oiço e não vejo.
Quero senti-las dentro de mim e depois interpretar.
Captar sua mensagem.

Parecem aflitas. Clamando.
O mundo passando e correndo,
As ignora.
Dizem-nos respeito.
Apelam ao belo da vida.
Apontam o sentido.
Iluminam o chão.

Reflectem a imagem real
Das falsas miragens.
Alertam.

A felicidade do homem está no belo e no bom.
O útil pode ser ou não ser.
É-nos exterior.
Não depende de nós.
Depende da hora e lugar.

Hoje, seria.
Não veio.
Amanhã, não será...

ouvindo concerto nº 2 de Brahms para piano e orquestra, por Garrick Ohlsson

Bar "Caracol" arredores de Mafra 19 de Março de 2016

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes




horas seráficas...

Horas seráficas...

Horas seráficas, breves e luzidias
As deste amanhecer de Março.
Um sábado de sol tímido e titubeante.
Sem saber se vem ou se vai.

Eu o chamo e insisto:
- fica.

Há um mar que te espera sequioso.
Teu calor é vida.
Tua luz é a sua razão de ser
Do seu azul.

Vem sol de Agosto!

Chama as gentes para a festa alegre
Das praias cheias.

Não se cala em casa a chilreada das crianças.
Querem brincar na areia.
Apanhar conchinhas.
Tecer colares.

Jogar ao prego,
Horas sem fim,
Na sombrinha das barracas.

Adormecer ao colo quente
Das suas mães.

Voltar para casa, pela noitinha,
Peito a arfar de iodo e sal...

Comer o caldo.
Pão com sardinhas.
E adormecer na paz de Deus...
Amanhã, ao amanhecer,
Outro dia de praia...

Mafra, bar Caracol, 19 de Março de 2016
9h9m

ouvindo Scumann

JLmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

sexta-feira, 18 de março de 2016

dedos cegos ...que sabem piano

Dedos que sentem e ouvem a voz da alma...

podem ser cegos os olhos.
mas se os dedos ouvem as ondas da alma
e fazem as cordas vibrarem.

se a luz me encandeia mas mostra a beleza do mar.

se meus ouvidos não ouvem
mas minha alma pressente quem chega e me abraça de pé...

e os meus pés se queixam das fragas do chão,
mas me levam às alturas do céu...

se não toco piano mas gosto de ouvir e escrevo poemas...

Que mais hei-de eu querer?...

ouvindo Nobuyiki tocando Liebestraum de Lizt

Bar "caracol" arredores de Mafra
18 de Março de 2016
11h7m
Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

nas asas do vento...

Nas asas do vento...

Deixei-me embalar e fui nas asas do vento,
Por esse mundo além.

Me alcandorei nas nuvens,
feito um rouxinol.

Ouvindo as notas breves dum piano a arder em fogo brando,
vinham da terra.

Era suaves. Por vezes, doces.
Tinham centelhas de divindade.
Tudo parou no céu a ouvi-las.
Como bem soavam...
Eram sonoras.

Tudo encantavam.
Eram dum génio.
Um criador.
Tão sublimes.
Rachmaninov.

Ali ficamos. 
Como perdidos.
Enamorados.

Que lindo voo.
Se foi tão breve.

ouvindo Rachmaninov, concerto nº 2, por Nobuyuk

Bar "Caracol" arredores de Mafra, manhã de chuva,

18 de Março de 2016
10h16m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

um barco de remos...

Num barco de remos...

Navego na terra,
Saído do mar.

Meu barco de remos
Baila nas ondas,
Floridas searas
Das serras,
Batidas de vento,
Expostas ao sol.

Sou pescador de tesouros ocultos,
Que os deuses antigos
Semearam algures,
Sem dizerem a ninguém.

Diz-se que guardam as chaves
Das portas das leis,
Que governam o mundo
E os sábios,
Que tudo estudaram,
Ainda não sabem...

Mafra, 18 de Março de 2016
8h3m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

quinta-feira, 17 de março de 2016

minhas amarras...

Minhas amarras...

São tantas e emaranhadas as amarras que me prendem.

Me liberto num esforço hercúleo.
Subo alto. Enxergo a lama que enxameia esta terra.
Lodo sujo.

Tanta violência sobre os mais fracos.
Tanta ganância cega.
Um inferno humano.

Se alimentam da desgraça que semeiam no mundo.

Fruto das guerras que só têm vítimas inocentes.

Caiam raios. Chovam intempéries nos seus domínios.
Os ponham por terra.
Os sepultem. Nos próprios escombros...

Volte a paz a brilhar no mundo.
Reino de alegria. Onde valha viver.

ouvindo Tanhauser de Wagner

Bar Castelão, centro de Mafra,
17 de Março de 2016
16h22m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

comboio do tempo...

Comboio do tempo...

Me sento cada manhã,
frente a esta janela do bar,
vendo o comboio do tempo
a passar.

Viagem de ida sem volta.
Nem pediu a ninguém para entrar.

Nele viajam amigos sem conta
nem hora marcada.
Ninguém sabe o destino.
Sabem que o comboio não pára.
Se pobre, se rico, se novo, se velho,
A todos, à vez, a porta se abre de vez.

Sem bandeira nem história.
Avança, correndo na estrada.
Indiferente.
Velocidade constante.

Há diversões. Emoções.
Dão para esquecer.
Parece sem fim.
Como se fosse para ficar.

Às duas por três,
Quando menos se espera.
Sem avisar.
Chega uma ordem.
Pegar ou largar.
Fecharam as contas.
Mais um que partiu.
Agora de vez.
E eu aqui vou.
Minha hora e a tua
Também hão-de chegar...

ouvindo "Os Nocturnos" de Chopin

Bar "Caracol", arredores de Mafra, 17 de Março de 2016

JLmg
Joaquim Luís Mendes Gomes




quarta-feira, 16 de março de 2016

um rio de sons...

Um rio de sons...

Escorre suave e leve,
desde o cimo do monte,
um fio tão fino
de água nascente.

Lava as pedrinhas,
expondo-as ao sol e ao ar.
De espuma, se cobrem as ervas.
E há peixinhos bébés
se banhando ao léu.

Pássaros bravios saltitam nas margens.
Procuram as larvas que vieram beber.

E o rio correndo,
Vai engrossando a voz.
Parece uma cobra calada,
deslizando incessante.

As sombras das árvores
se miram vaidosas
no espelho do rio.

Até as raízes se banham despidas,
indiferentes aos olhos sedentos.

E o fio de água dormente
avança e avança.
Fugindo do sol.
Arfa e arfa.
Nunca mais lhe chega a hora esperada
Daquele descanso sem fim
Nas águas profundas do mar...

ouvindo a mestria de Artur Rubinstein tocando Os 19 "Nocturnos " de Chopin como só ele sabe...

Bar "caracol" em Mafra 16 de Março de 2016
16h16m

JLMG
Joaquim Luís Mendes Gomes


compassos de espera...

Compassos de espera...
Enquanto o comboio não chega.
Há uma "bica" que espera numa mesa sozinha.
Há um conto ou poema que voam.
À espera que uma janela se abra.
Mais duas cabeças poisadas na mesa que dormem.
Depois duma viagem sem sono.
Incessantes comboios passam nervosos em cima.
Sobem e descem caladas parelhas de escadas rolantes.
Por trás das bilheteiras, dormentes,
Há rostos com nome que debitam bilhetes às bichas.
Enquanto nos bares se serem cafés e revistas.
Assim se passam as horas nas gares ...
Gare do Oriente, 3 de Afosto de 2015
9h30m
JLMG

doiradas mãos...

Mãos doiradas...

Sejam abençoadas todas as mãos abertas e prontas
que escrevem às cegas
o que lhes dita o coração e a alma.

Que indicam, indiscriminadamente, caminhos e sendas,
neste mar de desventuras.

Soerguem do chão os que caíram agarrados a laços que se desprenderam, inesperados.

Acariciam faces rasgadas de rugas e de feridas
das intempéries das suas vidas.

Que semeiam e plantam na hora certa para colherem e para ofertarem.

Que apertam outras mãos
naquelas horas más de indiferença ou de esquecimento.

Que ostentam anéis de luz
com alegria e fraternidade...

Bar "Castelão" em Mafra, 16 de Março de 2016
10h16m

ouvindo as mãos radiosas e jovens de Rubinstein sobre o piano, no concerto nº2  de Chopin

JLmg
Joaquim Luís Mendes Gomes




o dia a nascer...

O dia a nascer...
Saboreio cada pedacinho do dia que nasce
Como se fosse o último dia a nascer.
Cada passo que dou é um salto em frente. 
Abraçado à vida, presente.
A passada passou.
Foi nossa.
Se lembra, contente.
A futura pertence a Quem tudo dá e oferece com desvelo e amor.
Sempre assim foi, antes de mim e será.
Haja o que houver.
Por vezes, é difícil de ver.
Tanto mal pelo mundo...
Ele está. Universal.
É justo e atento.
De guarda e Senhor.
Em cada dia que nasce...
Bar "Castelão" no centro de Mafra, 16 de Março de 2016
8h41m
Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes

terça-feira, 15 de março de 2016

nicolau breyner...

Nicolau Breyner...

De surpresa, a sua morte.
Ele e morte eram e são
realidades antagónicas.

Porque pensar nele
era pensar num motor potente
com muita vida e tremenda força.

Seguíamos companheiros,
na contagem dos anos,
lado a lado.

Ambos nados, durante a guerra
e crescidos, sob o sopro dos mesmos ventos.

Eu, a norte.
Minhoto verde.
Ele ao sul.
Na pradaria alentejana.

Não foi o mesmo o nosso palco.
O dele, sempre a brincar
e muito a sério.

O meu, diverso rumo,
todo para o alto.

Tudo efémero.
Ele o provou...
O saúdo e lembro.

Mafra, 14 de Março de 2016
21h 5m

Jlmg
Joaquim Luís Mendes Gomes