sábado, 11 de maio de 2019

O gravador do frade

O gravador do frade Bernardo

O frade Bernardo estava de férias.
Por três meses. Missionário em África.
Bonacheirão. Era da família dos "paciências".
Eu era miúdo.
A garotada do lugar juntou-se à sua volta.
Sob uma grande ramada de uvas.
Pôs-se a falar connosco. Contando histórias lá de Angola.
E puxando por nós para que falássemos.
Eu perguntei-lhe porque foi para lá.
Podia ter ficado por Varziela.
- Sou beneditino. Minha vocação é missionário.
E gosto muito.
Cada um perguntou o que quis.

Em cima da mesa ele tinha um aparelho esquisito.
Duas rodas mexiam puxadas por uma fita.

Quando acabou, rebobinou tudo e voltou a ligar.

Começamos a ouvir tudo que se tinha falado.
Como era possível?
Ficamos de boca aberta.
Reconheci as vozes de todos. Menos a minha.
Perguntei:
- Porque não aparece a minha?
Inocência.

Ele sorriu.
Ora, ouve bem.
Pôs a falar de novo.
- Olha esta voz. É a tua.
- Impossível. Tão diferente.
- É assim mesmo. A que ouvimos é sempre diferente...
Nunca mais esqueci.
Quando o frade regressou de novo, já éramos crescidos.
Gravadores já eram familiares.
Mas o sonho nunca mais esqueci...

Berlim, 11 de Maio de 2019
12h52m
Jlmg

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